O governo Jair Bolsonaro planeja enviar ao Congresso Nacional
uma Medida Provisória (MP) que revê regras previdenciárias para deflagrar um
pente-fino em todos os benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS).
Para viabilizar a operação, a MP estabelecerá o pagamento de
um bônus de R$ 57,50 a técnicos e analistas do seguro social que identificarem
irregularidades em aposentadorias e pensões.
A medida provisória será apresentada pelo governo Bolsonaro
como um conjunto de ações para aperfeiçoamento e modernização da legislação.
A expectativa é que as novas regras possam gerar uma economia
de R$ 9,3 bilhões em um ano, já descontados os pagamentos dos bônus.
O valor corresponde a 4,2% do déficit previsto no RGPS
(Regime Geral de Previdência Social) para este ano. É um valor ínfimo perto de
um rombo total que deve bater em R$ 220 bilhões.
Quem acompanha o trabalho, porém, defende que a MP terá o
efeito de funcionar como uma espécie de ação moralizadora, para melhorar a
organização do INSS, corrigir distorções legais e coibir fraudes enquanto se
finaliza uma proposta mais ampla de reforma da Previdência.
Pela medida provisória, entram na mira dos fiscais a pensão
por morte, a aposentadoria rural e o auxílio-reclusão.
No caso de concessão de pensão por morte para quem não era
formalmente casado, uma das mudanças propostas na medida provisória é exigir,
além da demonstração de dependência econômica, a chamada prova documental
contemporânea --um documento que comprove a união na ocasião da morte.
O governo entende que a regra atual, que permite a
comprovação de união estável apenas com apresentação de testemunhas, abre
brechas para simulações e fraudes.
Na aposentadoria rural, a MP substitui a declaração do
sindicato rural pela autodeclaração do segurado.
Entidades credenciadas pelo Pronater (Programa Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma
Agrária) ficarão responsáveis pela homologação dessa autodeclaração do
beneficiário.
Para o governo Bolsonaro, o reconhecimento de direitos por
meio do sistema sindical é um resquício inadequado da mistura entre o Estado e
essas entidades.
O auxílio-reclusão, benefício pago aos dependentes do
trabalhador preso, passa a ter um período de carência (tempo mínimo de
contribuição consecutiva ao INSS) de 12 meses.
O benefício não poderá ser acumulado a outros e haverá
aferição de baixa renda com base em uma média dos salários. Hoje, o limite de
renda é definido a partir do último salário do trabalhador preso.
O governo estima que essa regra consiga reduzir a concessão
do benefício para pessoas fora do perfil de renda, mas que estão desempregadas
na véspera da prisão.
Esse modelo de conferência dos benefícios que a equipe de
Bolsonaro quer adotar com a MP é parecido com o usado pela gestão Michel Temer
(MDB) no pente-fino realizado nos auxílios-doença e nas aposentadorias por
invalidez pagos há mais de dois anos.
Desde 2016, os peritos médicos previdenciários estão
recebendo R$ 60 por exame extra realizado nos postos do INSS.
Até 15 de dezembro de 2018, quase 1,2 milhão de perícias
tinham sido realizadas no pente-fino dos benefícios por incapacidade.
Cerca de 651 mil segurados, praticamente a metade dos que
foram avaliados nos exames periciais, tiveram o pagamento cortado. A economia
com esses pagamentos foi de R$ 13,8 bilhões.
Segundo pessoas que participaram da elaboração da MP, o bônus
dos peritos será prorrogado por mais um ano, o pente-fino dos benefícios por
incapacidade será estendido e a atuação dos médicos será ampliada.
Eles trabalharão também em ações judiciais e em casos de
revisão de BPC (Benefício de Prestação Continuada).
As perícias do pente-fino, que até então convocaram
benefícios sem avaliação há mais de dois anos, chegarão a segurados que recebem
auxílio ou aposentadoria por invalidez há mais de seis meses.
O governo estima gastar R$ 56,9 milhões com o pagamento do
bônus aos técnicos e analistas previdenciários.
Em 2018, o INSS tentou viabilizar o pagamento de uma
bonificação para acelerar a análise de pedidos de benefícios e revisões e
reduzir os gastos com a correção monetária da fila de espera, mas o dinheiro
não foi liberado.
Sempre que o INSS leva mais de 45 dias para responder a um
pedido, o benefício, quando concedido, é pago com correção pelo INPC (Índice
Nacional de Preços ao Consumidor).
O governo calcula uma despesa superior a R$ 600 milhões ao
ano com essa correção, além de aumento nas disputas judiciais.
Levantamento realizado pelo TCU (Tribunal de Contas da União)
estima que mais de R$ 92 bilhões são pagos todos os anos após decisão judicial.
A expectativa da gestão Bolsonaro é que o incentivo à
conclusão de processos com suspeita de irregularidades resulte em uma economia
mensal de R$ 188 milhões, que poderia ser ampliada pela perspectiva de cobrar a
devolução do que foi pago irregularmente.
Para essa apuração, a medida provisória define que serão
considerados suspeitos os benefícios com indícios de acumulação indevida
(quando um segurado mantém dois benefícios que não poderiam ser pagos ao mesmo
tempo), suspeita de morte do beneficiário e BPC fora dos parâmetros previstos
em lei.
Os critérios são baseados em apontamentos do TCU em
fiscalizações e auditorias.
Segundo o INSS, 955,2 mil processos estavam parados, em
fevereiro de 2018, com suspeitas de irregularidades.
A média anual de análise de processos nas APS (Agências da
Previdência Social) ficou, entre 2010 e 2017, em 178.335 casos.
Para que o conjunto de novas regras possa ser adotado, e o
pente-fino, posto em prática, a MP vai alterar boa parte do arcabouço legal
previdenciário dos últimos 30 anos.
Serão revisados trechos de seis leis que foram promulgadas
entre 1991 e 2017.
BN
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