Dados sigilosos serão
fornecidos pelas empresas de telecomunicação para ajudar a monitorar
aglomerações
(Foto: Reprodução/O Livre | Arte: Felipe Martins) |
As operadoras de telecomunicação
repassarão informações sobre a circulação de pessoas para que o governo faça
avaliações e desenvolva estratégias de prevenção e combate à epidemia do novo
coronavírus. A parceria vai durar o período da calamidade pública da covid-19 e
envolve as empresas Vivo, Claro, Oi, Tim e Algar.
De acordo com o sindicato
das empresas do setor (Sinditelebrasil), serão repassados dados agregados e
anonimizados da circulação dos seus clientes. Os dados permitirão visualizar
“manchas de calor” da concentração de pessoas em localidades de todo o país,
auxiliando o governo a localizar onde estão ocorrendo aglomerações.
Quando uma pessoa liga um
celular, o aparelho se conecta a uma antena, chamada no linguajar técnico de
Estação Rádio-Base (ERB). Segundo o presidente executivo do Sinditelebrasil,
Marcos Ferrari, a informação repassada ao governo será de quando e onde
ocorreram essas conexões entre usuário e redes das operadoras.
“O que nós estamos
disponibilizando para o governo é este dado estatístico agregado. Não vamos
falar em número de linha nem em nome da pessoa. Em tal dia estavam conectadas
tantas linhas em tal antena. Isso é um mapa. Olha por cima do país e enxerga
como se dá a concentração de pessoas, deslocamento delas por meio deste
mecanismo estatístico”, disse Ferrari.
Os dados serão
consolidados no fim do dia e repassados a um servidor da empresa estadunidense
Microsoft, de onde poderão ser acessados pelo governo. Assim, o “mapa” mostrará
a situação sempre do dia anterior. As cinco operadoras possuem uma grande base
de dados, somando 214 milhões de chips (embora vários clientes tenham mais de
um chip).
“A forma como o governo
vai usar esse dado pode ser de diversas maneiras. A gente não vai interferir
nisso, pois é uma decisão do governo. Pode ser uma universidade que pode fazer
esse uso dos dados, ou empresa terceirizada que lide com inteligência
artificial. Para isso governo está botando a governança dele para aplicar de
maneira eficiente estes dados”, comenta o executivo do Sinditelebrasil. Ele
acrescenta que os princípios de proteção previstos na Lei Geral de Proteção de
Dados e do Marco Civil da Internet serão respeitados.
Transparência
Na avaliação do
conselheiro do Laboratório de Políticas Públicas e Internet da Universidade de
Brasília (Lapin) Thiago Moraes, é importante que o governo se certifique que os
dados disponibilizados na “nuvem” da Microsoft não sejam usados para outras finalidades.
Mesmo não estando em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados, ele defende que
seus princípios e diretrizes sejam respeitados.
“O Art. 6º atenta para que
o tratamento seja limitado ao mínimo necessário, e se evite o uso excessivo dos
dados. Isto significa, entre outras coisas, que uma vez superada a crise, os
dados coletados devem ser eliminados. É importante também que tão logo uma
política pública seja definida, sua finalidade seja transparecida à população
[o princípio da transparência previsto no art. 6º]”, destaca o pesquisador.
A Lei Geral de Proteção de
Dados instituiu as normas para coleta e tratamento de dados. Aprovada em 2018,
ela entraria em vigor em agosto, mas o Senado adiou o início da vigência para o
início do ano que vem. Contudo, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965 de 2014)
também prevê a garantia da privacidade dos dados dos internautas.
Para a coordenadora do
Coletivo Intervozes Marina Pita, a falta de uma legislação cria um vácuo
preocupante e seria importante ter mais informações sobre como os dados da
grande maioria da população serão tratados.
“Princípios como
proporcionalidade, necessidade e finalidade, incluindo o descarte após atingida
a finalidade, por exemplo, estão sendo observados? Deveria haver mais detalhes
inclusive em relação aos procedimentos de anonimização e agregação utilizados
porque há vários exemplos de reidentificação de dados anonimizados. Um sistema
como esse não pode perdurar e deveria haver formas de auditar e fiscalizar o
seu uso”, defende.
A Agência Brasil entrou em
contato com os ministérios da Saúde (MS) e da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações (MCTIC) e aguarda retorno.
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