O presidente Jair Bolsonaro sepultou a ideia de criação do
Renda Brasil até o fim de seu mandato, em 2022. Ele disse “vamos continuar com
o Bolsa Família e ponto final”. Sem a reformulação do programa de transferência
de renda, haverá poucos avanços na área em 2021.
A proposta de orçamento do governo prevê aumento da verba
anual do Bolsa Família, atrelada a mais beneficiários. Na prática, isso
significa que as famílias que recebem a ajuda não terão nenhum reajuste no
valor, tampouco verbas extras, como o 13.º em 2019 ou o auxílio emergencial
neste ano.
Além da quebra de expectativa das famílias – já que houve
repetidas declarações tanto da equipe econômica em relação ao novo programa
quanto do próprio presidente sobre o valor médio do benefício, que não deveria
ser inferior a R$ 300 –, há uma questão logística a ser resolvida.
O orçamento proposto pelo governo prevê a ampliação do
Bolsa Família para atender até a 15,2 milhões de famílias, sem alterações nas
condicionalidades do programa. Não há estimativas de quantas pessoas que
receberam auxílio emergencial – que atingiu 67,2 milhões de brasileiros ao
custo de R$ 196,2 bilhões até o dia 14 de setembro e ganhou regras mais rígidas
na última prorrogação – continuarão em situação de vulnerabilidade após o fim
dos pagamentos, e as perspectivas para o mercado de trabalho em 2021 são de
alta no desemprego.
Bolsa Família tem aumento no próximo orçamento
Quando apresentou a proposta de orçamento para 2021, em 31
de agosto, o governo separou uma verba maior para o Bolsa Família no ano que
vem. Os recursos para o programa aumentaram cerca de 15% em relação ao que
havia sido proposto para 2020 e representam um avanço de R$ 5 bilhões em
relação à média nominal dos últimos anos.
Evolução do orçamento do Bolsa Família
O governo propõe destinar R$ 34,9 bilhões para o
atendimento de 15,2 milhões de famílias ao longo de 2021, respeitando as atuais
regras de acesso ao programa. Para receber a ajuda, as famílias precisam ter
renda per capita igual ou inferior a R$ 178 mensais. Também há pagamentos
adicionais para crianças e adolescentes, desde que em dia com a vacinação e que
frequentem a escola, e para mulheres gestantes e lactantes.
Além disso, as famílias que ainda se mantenham abaixo da
linha de pobreza extrema – renda per capita igual ou inferior a R$ 89 –, ainda
recebem um benefício variável de superação da pobreza, calculado
individualmente.
O aumento que se dá para [o Ministério da] Cidadania é o
aumento do Bolsa Família, basicamente por uma questão socioeconômica: se prevê
que tenha um aumento das famílias que atendem os critérios de admissibilidade
do programa”, explicou George Soares, secretário de Orçamento do Ministério da
Economia, na coletiva em que a equipe apresentou a proposta.
Trabalhar com 15,2 milhões de famílias no próximo ano
representa um avanço de 2 milhões em relação a previsão feita para 2020 – e que
se mostrou subestimada, uma vez que o Bolsa Família já atende a 14,2 milhões de
famílias. O número também é inferior ao que foi estimado pela equipe do
ministro da Economia, Paulo Guedes, que chegou a projetar um programa para 22
milhões de famílias.
As famílias atendidas pelo programa
Caso o cenário estimado pelo governo se confirme, os R$
34,9 bilhões distribuídos a 15,2 milhões de famílias representam um benefício
médio de R$ 191,11 – a média de pagamento antes da pandemia estava na casa de
R$ 190. Ainda quando discutia a viabilização do Renda Brasil, o presidente
insistia que o benefício mensal médio deveria ser de, pelo menos, R$ 300.
Benefício médio pago aos beneficiários do Bolsa
Família
Além disso, o valor já orçado para o próximo ano não dá
margem para a reedição do 13.º benefício do programa, uma promessa de campanha
de Bolsonaro e que só foi viabilizada em 2019.
Na ocasião, o governo editou uma medida provisória que
previa o pagamento do benefício extra apenas em 2019. O então ministro da
Cidadania Osmar Terra chegou a declarar que a restrição foi feita porque a
proposta de orçamento para 2020 contemplaria o 13.º, o que não ocorreu.
Por causa da pandemia da Covid-19, os beneficiários do
programa acabaram transferidos para o auxílio emergencial, que pagou valores
muito superiores aos do Bolsa Família – foram cinco parcelas de R$ 600 e até
mais quatro de R$ 300."
Pressão por marca social da gestão Bolsonaro
A discussão acerca da criação do Renda Brasil ganhou força
em 2020, mas a pressão por um programa que representasse a marca social da
gestão Bolsonaro já vinha do ano passado, pois a área era considerada um
gargalo do governo. Na época, o presidente cobrava a formulação de uma proposta
que ampliasse os benefícios concedidos à população de baixa renda.
O sucesso do auxílio emergencial, benefício pago para
trabalhadores informais e população vulnerável durante a pandemia, acabou
aumentando essa pressão por dois motivos principais. A ajuda aos mais
necessitados teve efeitos diretos na redução da pobreza e manutenção da
atividade econômica durante os meses mais duros da crise sanitária em 2020,
embora tenha fragilizado as contas públicas e se tornado o fator preponderante
de aumento do déficit primário.
Além disso, a popularidade de Bolsonaro cresceu muito nesse
período, sobretudo junto às camadas mais pobres da população e no Nordeste, que
são setores em que o presidente não obtinha bom desempenho e onde havia
preferência pelo PT, por exemplo.
O grande entrave para a formulação do Renda Brasil é a
questão fiscal: não há espaço para aumentar o gasto público sem descumprir
regras como o teto de gastos, que podem ensejar até pedidos de impeachment do
presidente por crime de responsabilidade.
As principais ideias divulgadas pela equipe econômica
sempre giraram em torno da reformulação de programas considerados ineficientes,
como o seguro-defeso e o abono salarial, ou da desindexação do orçamento, com
congelamento de aposentadorias e restrições ao acesso do seguro-desemprego.
Essas propostas contrariavam muito Bolsonaro, que declarou
mais de uma vez que “não tiraria dos pobres para dar aos paupérrimos”. A
divulgação da intenção de congelar benefícios de aposentadoria para arrumar o
espaço fiscal necessário para a viabilização do Renda Brasil foi a gota d’água,
e o presidente optou por sepultar a proposta, que sequer chegou a ser
oficialmente apresentada.
Com informações Gazeta do Povo.
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