Em 20 de janeiro, dia da posse
do democrata, o governo brasileiro trocou o habitual telefonema para
cumprimentar o novo presidente dos EUA por uma longa carta, enviada à Casa
Branca para tentar abrir canais de diálogo com Biden
O presidente Joe Biden riu
nesta quinta-feira (28) após ser perguntado sobre quando iria conversar com
Jair Bolsonaro. Oito dias depois de assumir a Casa Branca, o democrata já falou
diretamente com ao menos sete chefes de Estado, mas ainda não há planos sobre a
vez do brasileiro.
Dentro do Salão Oval, Biden
foi questionado pela GloboNews se havia data prevista para uma conversa direta
com Bolsonaro, mas preferiu sorrir a responder.
Em 20 de janeiro, dia da posse
do democrata, o governo brasileiro trocou o habitual telefonema para cumprimentar
o novo presidente dos EUA por uma longa carta, enviada à Casa Branca para
tentar abrir canais de diálogo com Biden.
Bolsonaro era um apoiador
público de Donald Trump, ecoou a tese sem provas do republicano de que as
eleições americanas haviam sido fraudadas e, por mais de uma vez, dirigiu-se de
forma agressiva a Biden. Uma delas, quando o democrata sugeriu impor sanções
pela destruição da Amazônia e ofereceu fundos para conter a devastação na
floresta, e ouviu do brasileiro que não aceitava subornos.
Diante do cenário belicoso, a
avaliação de diplomatas e integrantes do setor militar do Planalto era que um
documento escrito seria a melhor –ou única– maneira de tentar baixar a
temperatura e sinalizar aos EUA e aos demais atores internacionais que o Brasil
tem disposição em continuar sua relação com Washington mesmo sem Trump.
O telefonema, naquela
circunstância, não cumpriria a missão, já que o conteúdo integral das ligações
é quase sempre privado. Além disso, Bolsonaro não fala inglês e não conseguiria
entabular uma conversa satisfatória com o americano –tradutores, geralmente,
tornam esses momentos ainda mais frios e protocolares.
Agora, a expectativa do
governo brasileiro é que a conversa entre Biden e Bolsonaro aconteça somente
quando houver uma medida específica para ser tratada pelos líderes –ou uma
emergência.
Desde que assumiu a Casa
Branca, Biden seguiu a tradição de falar com os chefes dos países vizinhos,
Justin Trudeau (Canadá) e Andrés Manuel López Obrador (México), e com líderes
de nações com relações tidas como estratégicas ou históricas com os EUA, como
Boris Johnson (Reino Unido), Emmanuel Macron (França), Angela Merkel
(Alemanha), Vladmir Putin (Rússia) e Yoshihide Suga (Japão).
Em entrevista coletiva nesta
quinta, a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, disse que o Brasil terá
papel-chave nas negociações sobre o clima, apesar de já ter dado mostras de que
o país –ou o telefonema com Bolsonaro– não será o foco de Biden nesse primeiro
momento.
"Esta [agenda do meio
ambiente] é uma grande prioridade para o presidente Biden e é por isso que ele
pediu a seu bom amigo, o ex-secretário [John] Kerry, para liderar nosso esforço
internacional para o clima, e certamente o Brasil será um parceiro-chave
nisso", afirmou Psaki.
O embaixador do Brasil nos
EUA, Nestor Forster, diz que não há diplomacia nova diante das prioridades do
novo governo e que é preciso "continuar o trabalho que já estava sendo
feito, com interlocução na Casa Branca e no Congresso, além do setor privado e
sociedade americana".
"A relação do governo
brasileiro com o governo americano não recomeça do zero [com a saída de Trump],
mas com um patrimônio de quase dois séculos de uma agenda de cooperação e
colaboração", afirma o embaixador. "Essa agenda é baseada nos valores
compartidos pelos dois países, a ideia não é só governo, mas respeito à
democracia, ao Estado de Direito, aos direitos humanos e à liberdade
econômica."
Há quem diga que John Kerry, o
czar do clima de Biden, tem perfil diplomático e não deve entrar em choque com
o governo brasileiro de saída, mas os mais céticos afirmam que ele precisará
mostrar serviço e, caso não consiga grandes avanços internamente, mirar um
vilão externo pode ser um caminho inteligente.
Assinada por Bolsonaro, a
carta do dia da posse de Biden tinha três páginas e 771 palavras, tentando
mostrar, entre outras coisas, que o país seria capaz de fazer alguma colaboração
nas questões ambientais –apesar do desmantelamento da política de meio ambiente
promovida pelo Planalto.
Biden assinou nesta
quarta-feira (27) um pacote de estimados US$ 2 trilhões para enfrentar a crise
climática. As medidas, que ainda precisam de aval do polarizado Congresso dos
EUA, atingem fortemente a indústria de gás e petróleo, incentivam a economia
sustentável e citam o desenvolvimento de um plano para a proteção da floresta
Amazônia.
Bolsonaro levou 38 dias para
felicitar Biden pela vitória. A imprensa americana costuma fazer uma projeção
do vencedor da disputa à Casa Branca pouco tempo depois do pleito, que é
confirmada pelo Colégio Eleitoral mais de um mês depois.
O líder brasileiro só tratou o
democrata como vitorioso em 15 de dezembro, um dia após a chancela do
colegiado.
Não há regra sobre como deve
ser o formato das felicitações a um presidente eleito, consideradas uma
cortesia diplomática, mas os últimos três líderes brasileiros optaram pelo
telefonema horas ou poucos dias depois da projeção dos resultados nos EUA.
Em 2016, Michel Temer
telefonou para Donald Trump em 9 de novembro, horas depois de a vitória do
republicano ser declarada. Já em 2012, a então presidente Dilma Rousseff
telefonou para Barack Obama um dia após sua reeleição, mas o democrata não pode
atender e reagendou a ligação para o dia seguinte.
Segundo assessores da petista,
os dois conversaram sobre desequilíbrio fiscal e questões raciais –a brasileira
lembrou que havia falado com a então primeira-dama Michelle Obama sobre a
preocupação de uma derrota de Obama ser debatida sobre esses pilares.
Em 2008, quando o primeiro
presidente negro da história dos EUA chegou à Casa Branca, era Lula quem estava
no Planalto. O petista tentou telefonar no mesmo dia em que eleição de Obama
foi projetada, mas não conseguiu contato devido ao assédio de diversos líderes
internacionais, e fez chegar às mãos de Obama uma mensagem de parabéns enviada
via fax.
LÍDERES QUE FALARAM COM BIDEN
AO TELEFONE APÓS A POSSE
Justin Trudeau
primeiro-ministro do Canadá,
em 22 de janeiro
Andrés Manuel López Obrador
presidente do México, em 22 de
janeiro
Boris Johnson
primeiro-ministro do Reino
Unido, em 23 de janeiro
Emmanuel Macron
presidente da França, em 24 de
janeiro
Angela Merkel
chanceler da Alemanha, em 25
de janeiro
Vladimir Putin
presidente da Rússia, em 26 de
janeiro
Yoshihide Suga
primeiro-ministro do Japão, em
27 de janeiro
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