Primas foram mortas em Mundo Novo em um intervalo de 28 dias
Uma dor avassaladora se repete
em menos de um mês e deixa uma família devastada na cidade de Mundo Novo,
região da Chapada Diamantina. Enquanto tentavam se erguer da perda brutal da
doméstica Jenilde de Jesus Pinheiro, 24 anos, assassinada a facadas pelo
ex-marido no último Natal (25), parentes dela tiveram que lidar com mais um
caso de feminicídio no seio familiar. Nesta quarta-feira (20), a prima de
Jenilde, a lavradora Rosineide Luiz da Silva, 25, morreu pelas mãos do
companheiro, que também lhe esfaqueou.
“Duas perdas que acabaram com
a gente. Estamos sem chão. Está sendo muito difícil lidar com essa situação. A
gente nunca está preparado para perder um parente, imagina dois em tão curto
tempo? E pela forma que aconteceu.... Estamos todos arrasados. Nossa família
está toda destruída”, disse um parente das primas que preferiu não se
identificar.
As duas eram mães e foram
mortas na frente de seus filhos pequenos. “A maldade que eles cometeram com
elas na frente das crianças. Isso não está sendo fácil para nós, os familiares,
que estamos com as crianças. Está sendo bem difícil, porque uns caras desses
não têm coração, não têm sentimento”, declarou o familiar.
Para além do parentesco,
Jenilde e Rosineide moravam na mesma rua.
“Elas se davam muito bem e se viam de vez em quando, porque Jenilde saia
cedo para trabalhar. Sempre que Jenilde ia ao mercado, passava na casa de
Rosineide, porque é caminho. As mortes delas foram uma triste coincidência.
Nunca vi um negócio desses”, lamentou o parente.
Gritos
A tragédia mais recente na
família aconteceu na noite de ontem, por volta das 17h, na Rua do Sape, próximo
ao Hospital Municipal de Mundo Novo. Mãe de quatro filhos, o mais velho tem 12
anos, Rosineide tinha acabado de chegar em casa depois de ter indo ver uns
amigos. Além das crianças, no imóvel estava também Nenê, com quem mantinha uma
relação há um ano.
Logo em seguida, os vizinhos
escutaram os gritos. “O pessoal acostumado a ver ela gritando com os meninos,
reclamando, não deu muita atenção. No espaço de alguns segundos, os meninos
saíram gritando o nome da avó, pedindo socorro: “minha mãe está furada, minha
está furada, socorro’. Falando bem assim. Quando os vizinhos chegaram, viram
que era verdade mesmo”, contou o familiar.
Rosineide chegou a ser
socorrida para o hospital da cidade, mas não resistiu. Ela sofreu duas
perfurações. O parente disse ainda que desconhece o motivo do crime. “Os
vizinhos disseram que eles brigavam muito, mas não sei informar muita coisa
porque moro distante dela”, declarou.
Segundo a Polícia Civil, horas
após a morte crime, o companheiro da vítima foi preso em flagrante, sendo
autuado por feminicídido. Durante o
depoimento, o suspeito negou a autoria do crime. “As apurações continuarão
sendo realizadas pelas equipes da delegacia de Mundo Novo, para a conclusão do
inquérito”, informou a polícia.
O sofrimento da família
começou no dia que era para de felicidade, 25 de dezembro no ano passado. Jenilde foi agredida com um murro no olho e
recebeu cinco golpes de faca após seu ex-companheiro, Anselmo dos Santos Reis,
31, ter invadido a casa onde a vítima morava com as filhas pequenas pela porta
dos fundos. Ele foi preso no seguinte ainda na cidade.
De acordo com a polícia, por
volta das 20h30, uma guarnição foi acionada para atender a uma ocorrência de
tentativa de feminicídio na Rua do Hospital. Ao chegar ao local, os policiais
foram informados que Jenilde havia sido esfaqueada e que populares já haviam
socorrido a vítima para o hospital municipal.
De acordo com o irmão da
vítima, Jenilson de Jesus Pinheiro, 29, Jenilde estava em casa com as filhas de
5 e 6 anos, que presenciaram o crime. Ela chegou a ser transferida para o
Hospital Clériston Andrade, em Feira de Santana, mas não resistiu aos
ferimentos.
Jenilson contou ainda que
Jenilde e Anselmo namoravam desde a adolescência e viveram juntos por 13 anos.
O casal estava separado há cerca de nove meses.
Nova regra do Ministério da
Saúde garante sigilo em casos de violência contra a mulher
Uma nova lei obriga as
unidades de saúde a manterem o sigilo das informações da vítima e do
profissional que a atendeu – seja um médico, enfermeira ou diretor do setor -
ao informar à polícia os casos de violência contra a mulher. Nem os nomes nem
os endereços serão divulgados às autoridades, apenas dados como idade, local de
ocorrência e tipo de violência. A nova determinação foi publicada através de
uma portaria GM/MS Nº 78, pelo Ministério da Saúde (MS), no Diário Oficial da
União, na última terça-feira (19). Segundo a desembargadora Nágila Brito,
presidente da Coordenadoria da Mulher do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA),
o objetivo é garantir a preservação da vida da mulher e não inibí-la de buscar
tratamento médico, por receio de denunciar.
“Sempre se teve dúvidas em
relação à questão do sigilo dos dados. E nós que trabalhamos com a matéria nos
preocupamos com o fato de isso poder afugentar a mulher em relação à
assistência à saúde, de ela deixar de buscar auxílio nos hospitais e também de
o médico deixar de encaminhar os dados de atendimento”, argumenta a
desembargadora. “O bem maior é a saúde e a vida, que as mulheres têm direito. A
gente tem que fazer tudo para garantir a saúde e a vida. É prioritariamente o
que a gente pretende”, completa Nágila.
A portaria discorre sobre dois
instrumentos legais: a notificação compulsória, para os casos de violência não
tão graves, e a comunicação externa, em que a polícia e o Ministério Público
são acionados para intervir. É o que explica a presidente da Coordenadoria da
Mulher. “A lei traz dois instrumentos, a notificação compulsória, que é para
aqueles casos de lesões que não sejam tão graves. Todos os casos em que haja
suspeita de violência contra mulher têm que ser notificados compulsoriamente.
Então vão os dados, só que sigilosamente. Ou seja, são dados dos fatos, idade
da vítima, local onde ocorreu. Nos casos graves, tem outro instrumento na lei,
que se chama comunicação externa, para os casos graves, em que coloca em risco
a vida da vítima ou possa colocar em risco também a comunidade”, explica.
De acordo com a
desembargadora, esses dados também poderão ajudar na construção de políticas
públicas. Ela deu o exemplo de uma plotagem de um carro de polícia com
informações de combate à violência contra a mulher ou divulgando informações
sobre a Lei Maria da Penha. “A pessoa que esteja praticando vai ficar com um
pouco de receio, porque está vendo que a polícia está ali e a presença do
estado policial às vezes pode inibir”, diz.
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