Investigação
da morte da menina em 2015, em Petrolina, passou por diversas instabilidades
A revelação
do suspeito de assassinar a menina Beatriz Angélica Mota, morta a facadas em 10
de dezembro de 2015 em um colégio particular de Petrolina, em Pernambuco,
representou um novo capítulo de uma investigação turbulenta.
Beatriz foi
morta durante a festa de formatura da irmã, no colégio Nossa Senhora
Auxiliadora, onde o pai era professor de inglês.
Na última
quarta-feira (12), a Secretaria de Defesa Social (SDS) divulgou que o suspeito
de matar a menina é Marcelo da Silva, 40. Quando foi beber água, a menina teria
se assustado ao ter contato com ele, segundo a pasta. De acordo com os
investigadores, Silva teria deferido dez facadas no corpo dela e confessado o
crime em depoimento nesta semana.
Silva vivia
em situação de rua, segundo a SDS, e teria entrado na escola já com a faca e
com a intenção de pedir dinheiro aos participantes do evento para poder deixar
Petrolina e voltar à cidade de Trindade, também no Sertão, onde vivia com a
família.
O
assassinato de Beatriz foi o caso policial que mais chamou a atenção em
Pernambuco dos últimos anos. Isso porque a investigação é longa —continua mesmo
com a revelação do suspeito— e passou por diversas instabilidades.
Nos últimos
seis anos, foram sete perícias, 24 volumes no inquérito, 442 depoimentos e 900
horas de imagens analisadas.
O caso
passou por oito delegados, uma média de um a cada nove meses. Recentemente,
ficou sob responsabilidade de uma força-tarefa formada por quatro
profissionais.
Tão logo
aconteceu o crime, a Polícia Civil acreditava que conseguiria chegar ao autor
do crime com facilidade porque a festa tinha mais de 2.500 pessoas, o que
significaria um número alto de possíveis testemunhas, e diante da possibilidade
de câmeras de monitoramento terem registrado a circulação e possível atuação do
suspeito.
Entretanto,
as imagens do circuito de segurança da escola foram apagadas inicialmente. Uma
investigação foi aberta para saber se o sumiço foi acidental ou proposital.
Em dezembro
de 2018, o Tribunal de Justiça de Pernambuco, a pedido do Ministério Público,
determinou a prisão preventiva de Alisson Henrique de Carvalho Cunha,
funcionário terceirizado do colégio.
A corte
entendeu, na ocasião, que ele apagou as imagens e interferiu na investigação.
Cunha não se entregou e foi considerado foragido. Em setembro de 2019, o
tribunal revogou o pedido de prisão.
O sumiço das
imagens passou a ser investigado em uma apuração à parte. A SDS diz que todas
as imagens foram recuperadas e entregues ao Ministério Público. Além disso,
três pessoas foram indiciadas nesse inquérito.
Em 2017,
imagens de uma câmera de segurança da área externa da escola, com resolução não
tão nítida, mostravam um homem circulando no entorno do colégio. Ele foi
apontado como o suspeito de matar Beatriz.
Com dúvidas
sobre os rumos da apuração, os pais de Beatriz, Sandro Mota e Lucinha Mota,
firmaram vínculo com uma empresa dos EUA para a realização de uma investigação
paralela sobre o caso. Os detalhes são mantidos em sigilo pela família.
A empresa
contratada divulgou em maio de 2021 um retrato falado do suspeito de matar a
menina.
Em dezembro
de 2021, Sandro e Lucinha fizeram uma caminhada de Petrolina até o Recife,
pedindo justiça.
Ao chegarem
à capital, em 28 de dezembro, foram recebidos pelo governador Paulo Câmara
(PSB) e por secretários de estado na sede da administração de Pernambuco.
Na ocasião,
Câmara manifestou apoio a um dos principais pleitos da família de Beatriz: a
federalização da investigação do caso.
No mesmo
dia, o governador assinou a demissão do perito Diego Henrique Leonel de
Oliveira Costa, que atuou no caso. De acordo com a corregedoria da SDS, ele
prestou consultoria de segurança por meio de uma empresa da qual é sócio ao
colégio onde Beatriz foi morta. Esse tipo de atuação é vedado por lei, segundo
o governo.
Acusado pela
morte de Beatriz, Silva foi transferido, nesta quinta (13), de Salgueiro, onde
estava preso por estupro de vulnerável, para uma unidade penitenciária de
Igarassu, na região metropolitana do Recife.
A SDS disse
que conseguiu chegar ao suspeito por meio da comparação do DNA de Silva, preso
desde 2017 por outro crime, com o coletado na faca usada no crime.
O DNA dele
foi inserido na base de dados estadual em 2019, quando houve uma atualização no
banco. O primeiro indício que levou ao nome dele surgiu no final de 2021,
quando se descobriu que seu DNA era o mesmo DNA encontrado na faca, segundo a
polícia.
No início
deste ano, o suspeito foi submetido a um procedimento relacionado ao outro
processo ao qual responde, ocasião em que houve nova coleta de seu DNA. Em
seguida, esse material foi usado para confirmar o que a polícia tinha atestado
anteriormente.
O DNA que
estava na faca foi comparado com o material genético de 125 pessoas
consideradas suspeitas.
Para a mãe
de Beatriz, Lucinha Mota, a investigação do caso foi prejudicada pela falta de
estrutura para investigação na Polícia Civil de Pernambuco.
"O
pouco que se tem no inquérito foi mérito de pessoas que estavam desejando a
solução do inquérito. Isso é mérito de determinadas pessoas, e não do estado e
das chefias dos departamentos das polícias de Pernambuco. Isso é boa vontade
dos profissionais. Criticamos os corruptos e os maus profissionais, mas sabemos
reconhecer os bons, mas infelizmente esses bons são perseguidos", diz
Lucinha.
Pais da menina Beatriz, Sandro e Lucinha Mota, em frente à Secretaria de Defesa Social de Pernambuco -
Em nota, a
Defensoria Pública de Pernambuco informou que não foi acionada para atuar na
defesa de Silva. O advogado Francisco Assis de Carvalho Neto, que atuou no
outro processo ao qual o suspeito responde, disse à reportagem que não está
constituído para atuar na defesa do homem no caso Beatriz.
O advogado
Rodrigo Almendra, responsável pela defesa de Diego Henrique Leonel de Oliveira
Costa, afirmou que o perito "não é acusado de interferir no caso Beatriz e
a demissão dele não tem relação com os trabalhos de investigação".
A reportagem
não conseguiu contato com Alisson Henrique de Carvalho Cunha nem com a defesa
dele. O advogado que o defendeu em 2019, Wank Medrado, alegou à época, em
entrevista à TV Grande Rio, que a acusação era frágil e que o funcionário
"não foi por conta própria no local das imagens e retirou, mas sim
atendendo a pedido de funcionários da escola que autorizaram a retirada para
posterior entrega das imagens à escola".
O colégio
Nossa Senhora Auxiliadora disse, na quarta-feira, que torce pela continuidade
das investigações do caso Beatriz e que "confia plenamente na elucidação
do caso".
A SDS não
respondeu às tentativas de entrevista com o secretário Humberto Freire e
delegados do caso.
Em nota, o
Ministério Público disse que "requisitou (à Polícia Civil) providências
imediatas para assegurar a ouvida do suspeito, a proteção à sua integridade
física e a realização de novas perícias complementares".