A nova linhagem combina partes da delta e da ômicron, mas
ainda não se sabe se ela tem maior capacidade de transmissão, pode levar a
quadros mais graves ou consegue escapar da imunidade prévia.
Os primeiros casos de covid relacionados a essa nova variante foram detectados na França em janeiro de 2022. — Foto: Getty Images/Via BBC
O Ministério da Saúde do Brasil confirmou nesta terça-feira
(15) os dois primeiros casos de Covid-19 no país causados pela variante chamada
de "deltacron".
Numa conversa com jornalistas, o ministro da Saúde, Marcelo
Queiroga, afirmou que essa nova versão do coronavírus foi detectada em um
paciente do Pará e em outro do Amapá.
"Essa é uma variante de importância, que requer
monitoramento. As variantes são classificadas como variantes de importância e
de preocupação, e as autoridades sanitárias estão aqui para, diante dessas
situações, tranquilizar a população brasileira", disse Queiroga.
Embora seja utilizado em reportagens e postagens de redes
sociais, o nome deltacron não é adotado oficialmente pelas instituições de
saúde. Por ora, a designação utilizada em estudos e publicações especializadas
para essa nova linhagem é AY.4/BA.1.
Confira a seguir o que já se sabe e o que ainda falta
conhecer sobre essa nova variante.
Origem e espalhamento
Os primeiros casos de uma variante do coronavírus que une
alguns genes da delta com outros da ômicron foram confirmados na França em
janeiro de 2022.
De lá para cá, ela também foi encontrada na Bélgica, na
Alemanha, na Dinamarca e na Holanda, de acordo com informações do Gisaid, uma
plataforma online onde cientistas do mundo todo compartilham sequências
genéticas do coronavírus.
Mais recentemente, alguns casos de Covid relacionados à
deltacron também foram observados nos Estados Unidos e, agora, no Brasil.
A quantidade de sequências positivas desta linhagem ainda é
bem baixa: até o momento, foram depositadas no Gisaid apenas 47 amostras da
AY.4/BA.1, sendo que 36 delas vêm da França.
Embora não seja uma informação conclusiva, o fato de esse
número não ter crescido de forma exponencial de janeiro para março pode ser
interpretado como um sinal preliminar de que essa linhagem não possui uma
capacidade de espalhamento superior à da ômicron.
Outro dado que corrobora essa perspectiva vem de um estudo
ainda não publicado por pesquisadores da Helix, uma empresa privada que
trabalha com sequenciamento genético nos Estados Unidos.
Os cientistas analisaram mais de 29 mil amostras positivas
para covid-19 que foram colhidas entre novembro de 2021 e fevereiro de 2022,
período em que tanto a delta quanto a ômicron circularam com bastante
intensidade por terras americanas.
De todos esses casos positivos, foram identificados apenas
dois que traziam a tal da deltacron.
Os autores concluem que, por ora, esses episódios com as duas
variantes são "raros" e "não existem evidências de que uma
combinação delta-ômicron resulta num vírus mais transmissível em comparação com
as linhagens da ômicron em circulação".
Como as variantes se misturam?
O virologista Felipe Naveca, que integra a Rede de Genômica
da Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz), explica que a recombinação de variantes não
é algo raro ou inesperado.
"É possível que isso já tenha acontecido várias vezes,
com outras linhagens. Mas, como no início as variantes do coronavírus não eram
tão diferentes umas das outras, ficava mais difícil detectar esses
eventos."
"Os vírus estão em constante evolução e o surgimento de
novas versões não é necessariamente uma coisa ruim. Precisamos agora avaliar e
entender o impacto que isso pode ter na pandemia", complementa.
Mas como essa recombinação acontece na prática? Primeiro, é
preciso ter em mente que os últimos meses foram marcados por uma intensa
circulação de duas variantes do coronavírus: a delta e a ômicron.
Nesse contexto, um indivíduo pode se infectar simultaneamente
com as duas versões do patógeno, ao ter contato com pessoas infectadas num bar,
no transporte público ou em qualquer outro local onde ocorrem aglomerações.
As duas variantes podem, então, infectar uma célula ao mesmo
tempo. O resultado desse processo é que as novas cópias de vírus que surgem
dali trazem alguns genes característicos da ômicron e outros pedaços do código
genético da delta.
No caso da deltacron, por exemplo, os cientistas observaram
que ela carrega a espícula da ômicron e o "corpo" da delta.
Vale lembrar aqui que a espícula, ou a proteína S, é uma
estrutura que fica na superfície do vírus. A função dela é se conectar aos
receptores das células humanas para dar início à infecção.
Ainda não está claro se essa "mistura" de duas
linhagens importantes do coronavírus pode causar um quadro mais grave, com
risco maior de hospitalização ou morte.
Também não existem informações se ela consegue escapar da
imunidade, conferida por uma infecção prévia ou pela vacinação.
Os cientistas estão fazendo pesquisas para responder a essas
perguntas e os primeiros resultados devem ser divulgados nas próximas semanas.