Segundo especialistas, controle financeiro e até grupo no
Whatsapp podem ajudar a limitar gastos.
O PIX chegou assustando muita gente, mas se tornou queridinho
pela facilidade do pagamento, com transferência instantânea e sem custos. Apenas
em seu primeiro ano, mais de 104 milhões pessoas fizeram pelo menos um
pagamento por ele.
A agilidade se torna ainda maior com a opção de parcelamento
do PIX. Embora a modalidade anunciada pelo Banco Central, chamada de PIX
Garantido, ainda não tenha sido lançada, algumas instituições oferecem
crédito para o consumidor parcelar seu pagamento.
No Banco Santander, o cliente divide o valor em até 24 vezes,
com débitos mensais automáticos e juros que começam em 2,09% ao mês. Procurados
pelo g1, Banco do Brasil, Itaú e Bradesco disseram que ainda não
aderiram à modalidade. E o Nubank não respondeu a reportagem.
No Picpay e no Digio (banco digital do Bradesco), o cliente
pode converter saldo do cartão de crédito em PIX. E aí os valores estão
sujeitos às regras e aos juros do cartão. No Mercado Pago, o juro evolui de
acordo com o histórico do cliente, mas parte de 2,5% ao mês.
E é aqui que especialistas ouvidas pelo g1 pedem
um pouco de atenção, para que a facilidade não se torne descontrole e até uma
dúvida no futuro. A planejadora financeira Aline Soaper e a professora de
coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV EAESP Cláudia Yoshinaga
dão dicas de como não se enrolar.
De R$ 20 em R$ 20, R$ 500
Soaper já viu muitos casos em que a pessoa fazia pequenos PIX
diários de R$ 10, R$ 20 e, no fim do mês, se assustava com um rombo R$ 500, até
R$ 800 bem naquela semana dura antes do pagamento. No fim do mês, sobrava
apenas a pergunta: "Como eu gastei tudo isso?".
Esses pequenos gastos "sem perceber" e sem previsão
no orçamento são grandes vilões do planejamento financeiro.
"E agora a gente tem outro problema, a nova modalidade
de parcelamento do PIX. Já vi casos em que a pessoa pode parcelar o pagamento
em até 24 vezes, uma nova espécie de cheque pré-datado, mas com juros altos.
Quem recebe, ganha à vista, mas quem parcela arca com o juro", conta a
planejadora.
A outra preocupação de Soaper é que o valor da parcela é
debitado automaticamente da conta. Então, se a pessoa não tiver saldo naquele
mês, o dinheiro pode sair do cheque especial e aí entrar no esquema de juros
altos da modalidade, diz a planejadora.
A professora Cláudia Yoshinaga alerta ainda para o efeito
psicológico das operações de crédito como cartão e cheque especial: as
pessoas automaticamente consideram esse limite como renda disponível para
gastar. "Existem várias pesquisas que mostram como as pessoas associam
limite de crédito como parte da renda e dinheiro disponível, uma associação que
não deveria ser feita."
Por que fazemos tanto PIX?
Se antes a gente conseguia recorrer a alguns truquezinhos pra
não gastar, como deixar o cartão em casa ou colar uma foto do Julius (de
"Todo mundo odeia o Chris") na carteira, o pagamento no celular põe
por terra essas barreiras físicas.
Desse jeito, fica mais difícil dizer não. Aline
conta que, para fugir de um produto que tentavam vender para ela na praia, ela
usou a velha tática: "estou sem carteira hoje". Quando o vendedor
disse que aceitava PIX e olhou para o celular, foi o bingo. Resultado: ela
gastou uma graninha em doces que nem queria tanto assim.
Além disso, também é mais fácil gastar quando a gente não vê
o dinheiro saindo da carteira, como nos casos de pagamentos com celular ou
relógio.
"Quando você não vê o dinheiro transitar, o sentimento
de perda diminui. Quando você dá uma encostada de celular, relógio ou faz um
PIX, não vê o dinheiro. Isso pode explicar um grau maior de impulsividade das
compras", explica Yoshinaga.
Como não se enrolar
- A
principal dica é ter um teto para esses gastos pequenos do dia a dia -
porque, vamos combinar, não adianta pensar que vamos só parar de gastar.
- Outro
truque é criar um grupo para contas no Whatsapp. E, todas as
vezes que fizer uma transferência, mandar o compovante para esse grupo.
Depois, é só somar os valores feitos. Se eles chegarem ao limite
estipulado, a pessoa já sabe que não pode mais fazer esses pequenos
pagamentos naquele mês.
- E,
claro, também entram as regras que valem para qualquer planejamento, com
ou sem descontrole de PIX: saber e destinar, antes do salário cair na
conta, porcentagens da renda para gastos específicos.
- Respirar
e contar até 10. Parece brincadeira, mas parar para pensar e refletir se
uma conta precisa ser parcelada (gerando dívida) ajuda na escolha.
"A maioria das pessoas só vai gastando. Nisso, o
dinheiro físico acabava ajudando porque se acabou o dinheiro na mão, a luz
vermelha já acendia. Saber quanto tem pra gastar ativa na cabeça da pessoa que
o dinheiro dela já está comprometido", diz Soaper.