Portaria estabelece que o número máximo de parcelas será de 24, e a taxa de juros não poderá ser superior a 3,5% ao mês.
Auxílio Brasil — Foto: André Melo Andrade/Immagini/Estadão Conteúdo |
O governo publicou no "Diário Oficial da União"
desta terça-feira (27) portaria que regulamenta o empréstimo consignado para
os beneficiários do
Auxílio Brasil.
No empréstimo consignado, o desconto é direto na fonte. Em
razão de as parcelas serem descontadas diretamente da folha de pagamentos, os
bancos têm a garantia de que as prestações serão pagas em dia.
A medida é criticada por especialistas, que apontam para o
risco de endividamento ainda maior da população mais vulnerável (leia mais
abaixo).
De acordo com a regulamentação, o valor máximo que poderá ser
contratado será aquele em que as parcelas comprometam até 40% do valor mensal
do benefício. Mas em vez de ser considerado o valor mínimo atual do benefício
de R$ 600, que só vale até dezembro, valerá o de R$ 400. Assim, o valor da
parcela será de no máximo R$ 160.
A portaria publicada estabelece ainda que o número máximo de
parcelas será de 24 e a taxa de juros não poderá ser superior a 3,5% ao mês.
O governo, por meio da Secretaria Nacional de Renda de
Cidadania (Senarc), será responsável por descontar dos benefícios as parcelas
do empréstimo mensalmente. Assim, o beneficiário vai receber apenas o valor
restante.
É obrigatório informar a taxa de juros aplicada e o custo
efetivo do empréstimo no momento da contratação.
É proibida a cobrança da Taxa de Abertura de Crédito (TAC) e
de outras taxas administrativas e também o estabelecimento de prazo de carência
para o início do pagamento das parcelas.
A título de comparação com outras modalidades de crédito,
dados do Banco Central mostram que as taxas médias mensais de juros relativas
ao mês de junho eram as seguintes:
- Consignado
para trabalhadores do setor público: 1,70%
- Consignado
pessoal total: 1,85%
- Consignado
para aposentados e pensionistas do INSS: 1,97%
- Consignado
para trabalhadores do setor privado: 2,61%
- Taxa
média mensal de juros para pessoas físicas: 3,52%
- Cheque
especial: 7,16%
- Cartão
de crédito rotativo: 13,77%
De acordo com as regras, se o benefício for cancelado, o
empréstimo não será cancelado. Ou seja, mesmo se deixar de receber o Auxílio Brasil, o
beneficiário precisa se organizar para pagar todos os meses o empréstimo até o
final do prazo do contrato, depositando na sua conta o valor da parcela.
Outras regras da portaria
Entre as outras regras da portaria estão:
- instituições
financeiras habilitadas estão proibidas de fazer marketing ativo, oferta
comercial, proposta, publicidade direcionada a beneficiário específico ou
qualquer tipo de atividade para convencer o beneficiário a fazer contratos
de empréstimo consignado;
- a
instituição financeira deve ter autorização do Banco Central para a
concessão do consignado, encaminhar ao Ministério da Cidadania pedido para
fazer as operações, ter habilitação para operações de consignados em
benefícios pagos pela Previdência Social - neste último caso, poderá haver
acordo de cooperação técnica entre a instituição financeira e o ministério
se não houver essa habilitação;
- o
beneficiário tomador do empréstimo deverá autorizar expressamente a
instituição financeira a ter acesso às informações pessoais e bancárias
necessárias à efetivação do contrato - não será aceita autorização dada
por telefone nem por meio de gravação de voz;
- a
responsabilidade pelo pagamento será somente do beneficiário em relação à
instituição financeira. Em nenhuma hipótese, o governo poderá ser
responsabilizado pela obrigação;
- o
crédito contratado deverá ser realizado exclusivamente na conta bancária
na qual é realizado o pagamento do Auxílio Brasil - caso o crédito do
benefício não seja realizado em conta bancária, o tomador deverá
regularizar seus dados cadastrais do Cadastro Único para que seja possível
a abertura da conta bancária;
- confirmado
o contrato, a instituição financeira deverá liberar o valor contratado no
prazo máximo de dois dias úteis a partir da confirmação;
- em
até cinco dias úteis, a instituição financeira deverá disponibilizar ao
beneficiário que solicitar a quitação antecipada do seu contrato o boleto
para pagamento, débito em conta ou transferência bancária, discriminando o
valor total antecipado, o valor do desconto e o valor líquido a pagar,
além da planilha demonstrativa do cálculo do saldo devedor;
- o
Ministério da Cidadania deve disponibilizar as informações sobre
empréstimos consignados em seu site, bem como a relação das instituições
financeiras credenciadas para operá-los, com indicação do número de
parcelas para pagamento e respectivas taxas de juros praticadas;
- em
caso de alteração do responsável pelo grupo familiar recebedor do
benefício, a autorização do empréstimo permanece válida enquanto o tomador
do empréstimo ainda for integrante do grupo familiar ou quando ele deixar
de morar com a família, mas permanecer como componente dela;
- se
houver modificação no valor do benefício ou da margem consignável, as
novas condições do empréstimo deverão ser pactuadas entre a instituição
financeira e o beneficiário, sem novos custos operacionais;
- a
cobrança do valor de parcela não descontada ou o saldo residual de parcela
descontada parcialmente é de inteira responsabilidade da instituição
financeira com o tomador do empréstimo.
Questionário
A portaria traz ainda um modelo de questionário que deverá
ser apresentado pela instituição financeira ao beneficiário no momento da
contratação do empréstimo.
Entre as perguntas que o beneficiário terá de responder estão
se ficou claro o valor do empréstimo, a taxa de juros mensal, o valor total que
irá pagar no final do contrato e o prazo do empréstimo, além valor da parcela e
até quando irá pagá-la. E se ele já fez as contas para ver se conseguirá honrar
esse compromisso junto com os outros gastos do dia a dia.
No questionário, há ainda um trecho que diz: "O
empréstimo consignado do Auxílio Brasil é uma opção que deve ser utilizada
apenas nos casos em que você realmente tem um problema que não pode resolver
sem fazer esta contratação. Verifique se alguém da sua família ou da sua
comunidade pode te oferecer outra solução, onde você não precise pagar
juros".
No momento da celebração do empréstimo, a instituição
financeira deverá informar ao beneficiário:
- o
valor total com e sem juros;
- a
taxa efetiva mensal e anual de juros;
- todos
os acréscimos remuneratórios, moratórios e tributários que eventualmente
incidam sobre o valor do crédito contratado;
- o
valor, número e periodicidade das prestações - o valor da parcela deverá
ser inteiro, não sendo admitida a informação de centavos no momento da
contratação;
- a
soma total a pagar com o empréstimo pessoal;
- a
data do início e fim do desconto;
- o
valor da comissão paga aos terceirizados contratados pelas instituições
financeiras para a operacionalização da venda do crédito, quando não for
efetuado por sua própria rede;
- o
CNPJ da agência bancária que realizou a contratação quando realizado na
própria rede, ou o CNPJ do correspondente bancário e o CPF do agente
subcontratado pelo anterior, acrescido de endereço e telefone;
- o
valor líquido do benefício restante após a eventual contratação do
empréstimo.
Valores indevidos
Nas situações em que for constatado desconto indevido de
parcelas em decorrência de contratação indevida, divergência no valor
contratado ou em que o desconto ocorra em valor superior ao limite
estabelecido, caberá à instituição financeira a responsabilidade pela devolução
do valor consignado indevidamente.
A devolução do valor deverá ser realizada no prazo máximo de
dois dias úteis da constatação da irregularidade, corrigido com base na
variação da taxa Selic, desde a data de vencimento da parcela referente ao
desconto indevido em folha até o dia útil anterior ao da efetiva devolução,
diretamente na conta de pagamento do Auxílio Brasil.
Quando identificado indício de irregularidade no processo de
contratação ou desconto do empréstimo consignado do Auxílio Brasil, a Senarc
deverá instaurar procedimento de apuração de irregularidade para regularização
da situação ou cancelamento do contrato do empréstimo.
Os indícios poderão ser identificados por meio de cruzamentos
de informações realizados preventivamente pela Senarc, pelos órgãos de controle
ou pela apresentação de reclamação pelo tomador do crédito.
Nos casos em que o desconto de parcelas de empréstimo
consignado tenha ocorrido em benefícios que venham a ser considerados
irregulares, os valores repassados às instituições financeiras deverão ser
ressarcidos diretamente ao Ministério da Cidadania, na competência seguinte à
decisão definitiva de apuração da irregularidade.
Cuidados
A portaria traz ainda os cuidados que os beneficiários
deverão ter. Entre as recomendações estão:
- Venda
casada é proibida: o banco não pode obrigar a contratar qualquer serviço, como
seguros ou títulos de capitalização, para liberar o empréstimo consignado.
Se isso acontecer, a recomendação é fazer a denúncia no site consumidor.gov.br e
não assinar o contrato. A venda casada é expressamente proibida pelo
Código de Defesa do Consumidor e considerado crime contra as relações de
consumo.
- Atraso
nas prestações:
caso haja atraso no pagamento das prestações, os valores serão acrescidos
de multa e juros conforme consta no contrato.
- Escolha
do banco: a
instituição financeira na qual está sendo contratado o empréstimo
consignado é escolhida diretamente pelo beneficiário. Verifique se todas
as informações prestadas pelo banco estão claras.
- Desconto
incorreto: caso
o desconto do empréstimo seja feito de forma diferente daquela que foi
contratada, procure o banco. Em casos assim, é possível registrar ainda
reclamação no site consumidor.gov.br ou
procurar o Procon e a Defensoria Pública da União ou dos estados.
Críticas
A oferta de crédito consignado por meio do Auxílio Brasil tem
sido criticada por especialistas e entidades. Eles alegam que a medida pode ser
danosa à população, porque os recursos do programa de transferência de renda
costumam ser utilizados para gastos básicos de sobrevivência.
Com o empréstimo, no entanto, o cidadão pode ter até 40% do
benefício descontado antes do pagamento. Bancos privados já teriam
manifestado ausência de interesse em operar a linha de crédito.
Entre os bancos mais prováveis a oferecer o empréstimo
consignado está a Caixa Econômica Federal, que opera os programas sociais do
governo, além do Banco do Brasil.
Fazer um empréstimo consignado ligado ao Auxílio Brasil pode
valer a pena para quem tem alguma necessidade urgente e inadiável – mas não
para pagar as contas do dia a dia, ou para fazer compras desnecessárias.
Isso porque o crédito pode comprometer a renda disponível do
beneficiário por um longo prazo. Assim, pode faltar dinheiro por vários meses
para fazer gastos essenciais, como alimentação.
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