Uma mulher de 26 anos foi assassinada após ser
"condenada" pelo chamado "tribunal do crime" do PCC
(Primeiro Comando da Capital) por negar um beijo a um traficante da facção
criminosa em um bar no Itaim Paulista, zona leste de São Paulo, e denunciar o
caso, segundo a polícia.
Após o episódio do assédio no bar, ocorrido na noite de 14 de
agosto, a vítima Karina Bezerra foi levada a um cativeiro, onde foi mantida em
cárcere privado. Ela escapou ao ser resgatada por policiais militares. A
mulher, então, relatou o que aconteceu em depoimento à Polícia Civil e ficou
escondida em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. Mas o seu paradeiro foi descoberto
há três semanas por membros do PCC. Segundo a polícia, ela foi assassinada. O
corpo ainda não foi encontrado.
Mulher foi morta na favela de Paraisópolis. Segundo a Polícia
Civil, Karina, que trabalhava como cuidadora de idosos, foi assassinada na
favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo.
Suspeitas de envolvimento no crime, três pessoas foram presas
em flagrante na última quarta-feira (14) pelo Deic (Departamento Estadual de
Investigações Criminais), indiciadas por tráfico, associação para o tráfico e
porte ilegal de arma.
Os agentes encontraram no local um revólver calibre 38 e
apreenderam drogas, como crack, cocaína, maconha e lança-perfume.
Entre os presos, estava Brendon Soares, 27, apontado pelos
investigadores como suspeito de ser o responsável pelo "tribunal do crime"
do PCC na favela.
Segundo a Polícia Civil, ele admitiu envolvimento no
assassinato de Karina, mas não deu informações sobre o paradeiro do corpo. O
UOL não conseguiu localizar a defesa do suspeito.
Os agentes também identificaram três imóveis a serviço do
crime organizado, onde eram armazenadas as drogas.
Como a vítima conseguiu escapar de um cativeiro atribuído ao
PCC após o assédio? Karina acusou um integrante do PCC de assediá-la em
depoimento registrado pelo 50º DP (Itaim Paulista).
Após resistir às investidas do traficante, que tentou
beijá-la e agarrá-la à força, ela disse ter sido sequestrada e mantida em
cárcere privado entre a madrugada do dia 14 de agosto e a manhã do dia
seguinte.
Em seu relato, disse só ter escapado da morte porque
policiais militares chegaram ao local. Devido ao episódio, foram presas nove
pessoas envolvidas no crime. Depois disso, Karina buscou refúgio em Taboão da
Serra.
Como foi o caso de assédio? Em depoimento, Karina disse ter
ido a um bar na estrada Dom João Nery, no Itaim Paulista, com três amigas por
volta das 22h de 14 de agosto. Cerca de duas horas depois, um rapaz
identificado apenas como "Xenon" sentou na sua mesa, dizendo estar
interessado nela. Mas ela disse ter recusado às investidas.
Contudo, ele teria insistido, segundo relato dado por Karina
à Polícia Civil. "[O traficante do PCC] passou a tocá-la, segurar os seus
braços, forçando abraços e beijos, mas ela se esquivou de todas as tentativas e
começou a se irritar com ele. Inclusive, o xingou e eles passaram a
discutir", disse, segundo relato em boletim de ocorrência ao qual o UOL
teve acesso.
"A facção [PCC] que se diz contra crimes sexuais obriga
mulheres a se relacionarem com os seus integrantes", disse o delegado
Pedro Ivo Corrêa dos Santos, da 5ª Delegacia de Investigações sobre Furtos e
Roubos a Bancos do Deic, responsável pela prisão dos suspeitos.
O que o traficante disse em meio à discussão? Após ser
rejeitado por Karina, o assediador disse "que ela iria ser a mulher dele, por
bem ou por mal, que ele era do PCC e que ficaria com quem ele quisesse",
detalhou a vítima em seu depoimento.
Como ela foi sequestrada? Após xingá-lo, Karina relatou que o
traficante reagiu, dizendo que "ela estava desacatando ele". Em
seguida, tomou a chave do seu veículo, a puxou pelo braço e anunciou que ela
seria sequestrada.
"Não é assim que se trata um irmão [em alusão ao fato de
ser 'batizado' como membro do PCC]", teria dito o traficante, de acordo
com o depoimento, antes de embarcar no veículo com outros três comparsas.
Depois de um trajeto que durou cerca de 15 minutos, Karina foi levada ao
cativeiro.
O que aconteceu no cativeiro? No cativeiro, Karina disse ter
tido braço e pernas amarradas enquanto era questionada pelo chamado
"tribunal do crime" por que não teria ficado com Xenon, que estava
armado no local e a ameaçou de morte.
"Depois, ele foi embora. Mas antes mandou que os caras
'dessem um jeito' nela", disse a vítima em depoimento à Polícia Civil.
Mudança de cativeiro. Pela manhã, Karina disse ter
presenciado a chegada de outras duas pessoas. Em seguida, relatou ter sido
levada em um veículo para outro cativeiro, em frente a um barraco. Segundo ela,
os criminosos aguardavam pela chegada de "Xenon" quando foram
interceptados pelos policiais militares.
Como vítima foi localizada pelo PCC. Segundo a Polícia Civil,
Karina foi para Taboão da Serra após relatar o episódio em depoimento, com medo
de ser localizada pelo PCC. Contudo, a facção criminosa encontrou o seu
paradeiro e a assassinou em outro "tribunal do crime".
Áudios indicam como foi o crime. Áudios atribuídos a
traficantes envolvidos no assassinato obtidos pelo UOL dão detalhes do crime.
"A menina lá, certo mano? Que 'tava' nas mãos dos
parceiros que foi (sic) em 'cana' [presos pela polícia onde Karina foi mantida
em cativeiro], tá em Taboão da Serra. Ela procurou lá um moleque que ela ficou.
O moleque procurou a 'disciplina' lá [como são chamados membros do PCC]. Os
irmãos já pulou pra montar um tabuleiro [tribunal do crime do PCC, na gíria].
Deixar ciente pros parceiros aí".
Um outro traficante cita ainda a versão apresentada por
Karina do assédio que deu origem ao episódio. Segundo ele, a vítima teria
relatado a investida do traficante em meio ao "tribunal do crime". O
criminoso inclusive citou o apelido relatado no boletim de ocorrência.
"Ela está mandando as mesmas ideias que ela mandou pra
polícia lá, entendeu? Que o 'Xenon' lá, já mandou o vulgo do irmão, quis ficar
com ela, ela não quis. Os irmãos foi [sic], pegou ela e levou ela pro
'tabuleiro'. Aí, os parceiros já montou [sic] o tabuleiro lá pra ver se traz
ela pra mão, entendeu, quadrilha? Deixar ciente pros parceiros aí".
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