A estratégia do PT para tentar afastar Bolsonaro das próximas eleições

Partido vai entrar com mais duas ações no TSE contra o presidente da República para tentar aumentar as chances de uma condenação que o torne inelegível

 

O presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada, após as eleições Cristiano Mariz/Agência O Globo

No último dia 30, Jair Bolsonaro tornou-se o primeiro presidente da República a não ganhar nas urnas um segundo mandato, desde que o instituto da reeleição entrou em vigor, em 1997. Se depender do PT, Bolsonaro pode sofrer outro revés também inédito: ser o primeiro ex-presidente condenado por abuso de poder pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e impedido de disputar qualquer eleição pelos próximos oito anos.

A coligação de Lula e Alckmin, que já entrou com seis ações contra a campanha de Bolsonaro e do companheiro de chapa, Walter Braga Netto, está elaborando mais duas para serem apresentadas nas próximas semanas.

A ideia é aumentar a pressão sobre o atual ocupante Palácio do Planalto depois que ele deixar o governo, além de aumentar as chances de ele ser condenado e perder o direito de disputar eleições.

Os novos processos vão acusar o presidente da República de promover abuso de poder político e econômico ao desembolsar bilhões de reais para garantir o Auxílio Brasil de R$ 600 em pleno período eleitoral.

Em outro processo, vão alegar que Bolsonaro fez uso indevido dos meios de comunicação ao usar a estrutura do Palácio da Alvorada para atacar o sistema eleitoral e o Poder Judiciário.

Esses processos são “AIJEs”, sigla para “ação de investigação judicial eleitoral”, e podem levar à cassação de políticos e à declaração de inelegibilidade. Eles não têm prazo de validade e podem ser julgadas até mesmo anos depois da eleição.

Foi uma ação desse tipo que levou à investigação de abuso de poder político da chapa Dilma-Temer nas eleições de 2014. Em 2017, o TSE arquivou a ação pelo apertadíssimo placar de 4 a 3, naquela que ficou conhecida como uma não-cassação “por excesso de provas”.

As AIJEs ficam sob a responsabilidade do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, que hoje é o ministro Benedito Gonçalves.

Em julgamentos recentes do plenário do TSE, Benedito tem se aliado ao presidente da Corte, Alexandre de Moraes, e aos ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, e imposto reveses ao atual ocupante do Palácio do Planalto.

Um exemplo foi o caso em que o tribunal mandou suspender a monetização de quatro canais bolsonaristas e entendeu que Lula poderia, sim, chamar Bolsonaro de “genocida”.

Por ser o relator, Benedito dita o ritmo do processo, determina diligências, analisa provas decide quanto liberar o caso para análise dos colegas. Até agora, o ministro tem tratado essas investigações com celeridade.

O fator tempo, no entanto, pode jogar a favor de Bolsonaro.

Em novembro do ano que vem, Benedito se despede do TSE e passa a corregedoria para Raul Araújo, considerado bolsonarista pelos colegas. Foi Araújo quem proibiu a manifestação política de artistas no festival Lollapalooza, em uma decisão duramente criticada pelos colegas nos bastidores.

Até hoje, o TSE já cassou vereadores, prefeitos, deputados e até governadores, mas jamais um presidente ou ex-presidente da República.

Por isso, na prática, as AIJEs servem com uma espada permanente sobre a cabeça do presidente ou do ex-presidente.

Durante boa parte do seu mandato, Bolsonaro viveu sob a ameaça de uma ação desse tipo, que investigava o disparo de mensagens pelo WhatsApp nas eleições de 2018.

Na época, integrantes do poder Judiciário espalharam nos bastidores que havia provas “robustas” contra o chefe do Executivo, que poderiam levar à sua cassação.

Era uma tentativa de tentar enquadrar Bolsonaro e de fazer parar sua ofensiva contra o TSE, mas a ação foi arquivada por falta de provas.

Os ministros, porém, firmaram um entendimento para ser aplicado em casos futuros – o de que o uso de aplicativos para disparo em massa de fake news contra adversários pode, sim, configurar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação e, portanto, levar à cassação.

Por enquanto, a principal aposta do PT contra Bolsonaro é uma ação em aberta no mês passado, em que o partido pede a investigação de uma rede de desinformação para favorecer o presidente da República.

Foi nesse caso que Benedito determinou a desmonetização de canais suspeitos de propagação de conteúdos inverídicos e a suspensão da exibição, até 31 de outubro, do documentário "Quem mandou matar Jair Bolsonaro?”, que fala sobre o episódio ocorrido em 2018 contra o então candidato à presidência da República.

A ofensiva jurídica do PT pode até não chegar à inelegibilidade de Bolsonaro. Ainda assim, podem manter o adversário sob pressão durante um bom tempo, o que já terá sido bastante conveniente para o partido de Lula.

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