Entidade diz que o critério para o aumento não tem validade
jurídica. MEC anunciou aumento de quase 15% no mínimo pago por prefeituras e
estados a profissionais da educação básica.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) criticou nesta
terça-feira (17) o reajuste do piso salarial dos professores oficializado pelo
Ministério da Educação (MEC) e, pelo segundo ano seguido, voltou a orientar os
gestores municipais a ignorar o aumento anunciado pelo governo federal.
"O impacto torna ingovernável. Estamos orientando os municípios
a não concederem, por mais que entendamos como importante. Esse montante
inviabiliza a educação no Brasil. Aí, nós vamos ver o MEC apresentando grandes
projetos para salvar a educação no Brasil, enquanto tira esse valor dos
municípios", declarou o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.
O MEC anunciou na segunda (16) um aumento de quase 15%
no mínimo pago a professores da educação básica. O piso – que será atualizado de R$ 3.845,63
para R$ 4.420,55 – é definido pelo governo federal, mas o pagamento é feito
pelas prefeituras e governos estaduais.
Para a CNM, o custo total desse reajuste pode impactar a
gestão educacional no Brasil e agravar a situação fiscal dos municípios. A
estimativa, divulgada pelo presidente da entidade, é de que o aumento custe R$
19,4 bilhões anualmente aos municípios.
"É importante, sim, o piso, mas sabemos que não é assim
[que deve ser concedido]. Tem que ter o piso, tem que valorizar o magistério,
mas não desse jeito", declarou.
"Se o município quiser cumprir, dar 80% de reajuste, ele
pode. Agora, se isso vai acabar com a educação, com as contas públicas dele, é
problema dele."
A entidade ainda argumenta que a atualização do salário-base
não tem respaldo jurídico. Segundo técnicos da confederação, o critério
utilizado perdeu validade com o início da vigência da lei que criou o novo
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb) – entenda abaixo.
"Nosso entendimento, e da própria AGU, é de que a lei
foi revogada. O critério de reajuste do piso não tem eficácia legal e persiste
a insegurança jurídica devido ao vácuo legislativo na definição do novo
critério de reajuste", afirmou Ziulkoski.
O reajuste do piso salarial do magistério (profissionais com
formação em magistério em nível médio e carga horária de trabalho de 40 horas
semanais) é concedido anualmente em janeiro. É calculado com base na comparação
do valor anual por aluno do Fundeb dos dois últimos anos.
Entre 2021 e 2022, a variação registrada foi de 14,95% –
exatamente a atualização oficializada pelo governo federal.
Para a CNM, a correção do piso deveria seguir o acumulado de
2022 do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que totalizou 5,93%.
Impasse jurídico
O entendimento da CNM é de que a lei do piso, sancionada por
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2008, está vinculada ao antigo Fundeb –
revogado em 2020 – e, por essa razão, não seria mais válida.
Em 2020, a emenda constitucional que estabeleceu caráter
permanente ao Fundeb mudou a nomenclatura dada ao valor anual por aluno e
revogou a lei em vigência que tratava do fundo.
Para os técnicos da CNM, a lei do piso salarial do magistério
faz referência à nomenclatura e descrição anteriores do critério. Além disso,
por não ter sido atualizado, o trecho que trata da maneira com o qual o
reajuste deve ser feito também faz referência à lei anterior, revogada com a
emenda à Constituição.
Esses argumentos foram utilizados pela entidade para
questionar o reajuste concedido em 2022, após represamento em 2021 pelo governo
do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). À época, a consultoria jurídica do MEC
concordou com a tese e apontou que seria necessária nova regulamentação sobre o
tema.
Pesquisa feita pela CNM aponta que, em 2022, quase 1,8 mil
municípios pagaram reajustes diferentes do anunciado pelo governo federal.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE),
representante dos profissionais da educação, discorda do posicionamento da CNM.
Segundo a entidade, a lei do piso mínimo segue válida e o reajuste deve ser
imediato.
A CNTE argumenta que o Supremo Tribunal Federal (STF)
confirmou a constitucionalidade dos critérios de reajuste em 2021, quando a
emenda à Constituição que gerou, na avaliação da CNM, uma insegurança jurídica
já havia sido promulgada.
Resolução no Congresso
A CNM defende que as prefeituras não são obrigadas a dar o
reajuste. A entidade afirma que os gestores devem ter cautela ao conceder os
aumentos.
A confederação também defende que o Congresso Nacional
discuta um novo regulamento para as atualizações. Para Ziulkoski, é preciso
criar uma legislação que modernize os critérios de aumento do piso, mas
considerando as realidades municipais.
“Acho que vai ter que vir da fonte do recurso para pagar.
Essa lei tem que ser construída para que cada município conceda, na sua
realidade, o aumento”, disse.
Segundo ele, ainda não houve um convite para um diálogo por
parte do governo federal. "O governo não nos convidou para discutir nada
até agora. Já passamos aí 60 dias da transição”, afirmou. "Se houvesse um
diálogo mínimo, poderíamos construir uma solução juntos.”