Em entrevista à BBC News Brasil, Thiago Albuquerque relata ter sofrido ameaças pela internet após ter seus dados vinculados à imagem de homem que simula defecar no Supremo, durante invasão bolsonarista no domingo. Após apuração, Banco do Brasil disse que não se trata do funcionário e que informação é fake news.
foto: Reprodução |
A foto e os dados de Thiago Albuquerque, funcionário do Banco
do Brasil, viralizaram nas redes sociais, associando o perfil dele ao vídeo em
que um homem aparece simulando defecar no Supremo Tribunal Federal (STF) no
domingo (8/1).
Após apuração, o Banco do Brasil divulgou nota afirmando que a imagem "não
é de funcionário do BB citado em fake news em redes sociais".
À BBC News Brasil, Albuquerque diz que "nem em Brasília estava", mas
segue recebendo ameaças pelas redes sociais - o que o motivou a deixar sua casa
temporariamente.
"A velocidade em que uma notícia falsa se espalha não é a mesma de uma
notícia que vem para corrigir esse erro", diz. "Uma informação falsa
pode acabar com a vida da gente em questão de minutos."
Albuquerque disse que, na segunda-feira (9/1), quando estava de licença médica
por sintomas de covid, ficou sabendo por um colega de trabalho que sua imagem
estava se espalhando.
"Eu estava tomando café, assistindo noticiário sobre a gravidade (da
invasão), com tudo quebrado em Brasília e algumas pessoas indo presas e tudo
mais. E aí um colega do banco me mandou uma mensagem no WhatsApp perguntando se
eu já tinha conhecimento dos boatos que estavam envolvendo o meu nome e me
mandou o vídeo da pessoa supostamente defecando numa mesa."
Ele diz que a sensação foi a de "cair em um abismo". "A gente
fica sem chão. Não tem nada que possa fazer para desmentir uma situação
dessa."
Em seguida, a notícia começou a se espalhar e o gerente da agência na qual ele
trabalha entrou em contato para pedir informações sobre o caso.
Albuquerque, que fez boletim de ocorrência e diz não ter sido procurado pela
polícia em nenhum momento, reclama de ter se visto em uma situação em que teve
que provar que uma acusação divulgada em redes sociais era falsa.
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"Eu me senti um criminoso", diz. "O ônus da prova deveria ser de
quem acusa."
Ele informou à área de segurança do Banco do Brasil que estava em uma cidade
próxima a Goiânia no fim de semana - e apresentou extrato de transações no
pedágio de Alexânia (entre Brasília e Goiânia) no sábado, quando conta ter
partido do DF, e na noite de domingo, quando conta que retornou ao Distrito Federal,
com chegada após 22h.
Também compartilhou informações da sua linha do tempo do Google Maps -
ferramenta que, com base no histórico de localização, mostra os lugares que a
pessoa esteve e possíveis trajetos usados.
Ele diz que, em uma hipótese de uma apuração policial, teria como álibis as
pessoas que estavam com ele fora do Distrito Federal, além de imagens de
câmeras de segurança fora do DF.
"Mas eu tenho ocasiões na minha vida que eu tiro folga, férias, e eu gosto
muito de ir para a natureza, de ficar em sítio, sem contato com nada. Imagina
se eu tivesse uma situação dessa? Vamos supor que demorasse uma semana até eu
ter conhecimento dessa situação. Como é que estaria a minha vida agora? Aí eu
pego uma rodovia, paro num comércio, e de repente eu estou sendo xingado,
agredido, não tô nem sabendo o que está acontecendo."
Embora seja difícil identificar o rosto do homem que aparece no vídeo - de
costas e de chapéu -, Albuquerque diz, ainda, que o biotipo não é semelhante ao
dele. "Meu tipo físico é bem diferente, eu sou bem mais gordinho, o cara é
magro e tudo. E eu parto do princípio que, se você não tem certeza em
identificar uma pessoa, você não deve fazer isso."
Mesmo assim, ele conta, recebeu desconfiança inclusive de alguns familiares
mais distantes. "Não sei como vai ser daqui pra frente o convívio com
minha família. Algumas pessoas estão em minha defesa, outras não. Nunca tive
esse tipo de problema."
Questionado se participou de outras manifestações ou do acampamento na área
militar em Brasília, Albuquerque disse que "nunca participou desse tipo de
ato".
Albuquerque, que agora reúne informações sobre as acusações e ameaças, diz que
buscará a orientação de um advogado.
"Você consegue amenizar o dano à imagem, mas você não repara 100% nunca
mais."
Apoiadores de Bolsonaro invadiram prédios públicos em Brasília no domingo |
O que disse o Banco do Brasil
Procurada pela BBC News Brasil nesta terça-feira, a assessoria de imprensa do
Banco do Brasil disse que "assim que tomou conhecimento sobre os relatos
em redes sociais, o BB atuou prontamente no levantamento de informações, sempre
em contato permanente com as autoridades competentes, responsáveis pela
investigação do caso".
Disse, ainda, que atuou "com total zelo na apuração da falsa acusação
contra o funcionário do Banco". "Assim que teve condições técnicas e
evidências suficientes, comunicou prontamente à imprensa que se tratava de fake
news."
A imagem com os dados de Albuquerque que foi veiculada nas redes sociais é a
captura de tela de uma plataforma interna da instituição, chamada humanograma.
A reportagem questionou se o banco identificou os responsáveis pela divulgação
desses dados. A assessoria respondeu que "foram tomadas todas as medidas
administrativas para apuração sobre envolvimento de funcionários que possam ter
descumprido normativos internos no referido caso".
Inicialmente, na segunda-feira, o Banco do Brasil - cobrado nas redes sociais
para agir contra o funcionário - divulgou uma nota que ainda não negava se
tratar de um funcionário da instituição. O texto apenas repudiava a violência e
dizia que auxiliaria nas investigações.
Um funcionário do Banco do Brasil que participou da apuração caso e falou com a
reportagem em condição de anonimato apontou que o fato de o rosto do homem ser
pouco visível no vídeo dificultou a confirmação de que não era Albuquerque.
Também disse que houve uma checagem de nomes com autoridades policiais.
Já em nota oficial divulgada na noite de segunda-feira o Banco do Brasil disse
que, após apuração, identificou que "não se trata de funcionário do BB
citado em boatos que circulam nesta fake news que surgiu nas redes
sociais".
Afirmou, ainda, que "desconhece a identidade da pessoa que aparece no
vídeo, assim como não há indícios de que se trate de um funcionário do BB na
cena lamentável".
Não descartou, no entanto, a participação de outros funcionários do banco nas
invasões, ao dizer que "auxiliará nas investigações das autoridades
competentes no que for necessário para identificar qualquer funcionário que
possa ter participado de atos de vandalismo em Brasília".
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-64221071