Não devolver uma transferência recebida por engano pode
configurar crime de apropriação indébita; aqui explicamos o que fazer se
cometer um erro ou for vítima de golpe.
Com PIX, pagamento e transferência ficam mais fáceis de serem feitos, apenas com o celular ou smartphone — Foto: Júlia Martins
Imagine que você está em casa, “de boas”, assistindo a uma
série de televisão. De repente, pinta uma notificação no celular: é um
PIX de R$ 500 que caiu na sua conta (e você não estava esperando).
Para muitos, a primeira reação seria de euforia. "Ufa,
um alívio para as contas do mês!" Mas ficar com um dinheiro que não é
seu pode configurar crime de apropriação indébita. Nesta reportagem, você vai
aprender:
- O
que fazer se mandar um PIX por engano;
- O
que fazer se receber um PIX por engano;
- O
que fazer se for vítima de golpe;
- Como evitar
fazer transferências erradas.
O cenário hipotético do início desta reportagem, na verdade,
realmente aconteceu com uma estudante de Macapá (AP). Julia Penafort, de 23
anos, recebeu um PIX de R$ 500 por engano no último dia 13 de maio.
Julia, de Macapá (AP), recebeu um PIX por engano e devolveu o valor — Foto: Julia Penafort/Arquivo pessoal
A reação da estudante foi entrar em contato com o banco
perguntando o que deveria fazer para estornar o valor. Logo depois, ela recebeu
uma mensagem da pessoa que fez o PIX pedindo a devolução.
“Ele me mandou o nome completo dele, CPF, aí eu chequei os
dados e devolvi. Ele pediu desculpas pelo engano e agradeceu bastante por eu
ter sido, como ele falou, muito honesta", conta Julia.
“Ele até falou que eu podia ficar com R$ 50. Eu disse que não
precisava, mas ele insistiu e depois acabou me mandando mesmo assim. Mas não
precisava porque eu acho que isso é o mínimo, a gente não tem que se aproveitar
dessa situação”, continua a estudante.
Mas a postura da Julia, infelizmente, não é a adotada em
todos os casos. Caso o destinatário não devolva o PIX de “boa-fé”, o
usuário pode procurar a Justiça, como explica Breno Lobo, consultor do Banco
Central do Brasil.
Mandei um PIX errado. Dá para cancelar?
O cancelamento de uma transferência via PIX só é
possível em caso de agendamento, ou seja, se o valor ainda não tiver sido
enviado ao destinatário.
A primeira coisa a se fazer depois de mandar um PIX por
engano, de acordo com o consultor, é tentar entrar em contato com a pessoa
que recebeu o valor.
Ao fazer a transferência, o usuário tem acesso aos dados
pessoais do recebedor, como nome completo e agência bancária, então quem enviou
o PIX pode usar essas informações para encontrar o destinatário e pedir a devolução. E
se a chave PIX for celular ou e-mail, fica ainda mais fácil.
“Quem tem que iniciar a transação nesse caso é o usuário
recebedor", explica Lobo.
"Se não resolver de boa-fé, a pessoa que fez o PIX deve
acionar o banco, porque ele tem todos os dados da pessoa que recebeu e pode
entrar em contato com a instituição na qual o recebedor tem conta, para que
haja a devolução dos recursos”, explica Lobo.
Tudo falhou? É hora de fazer boletim de ocorrência e
procurar a Justiça, como instrui o advogado Solano de Camargo, presidente da
Comissão de Privacidade e Proteção de Dados da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB).
“Ela vai entrar com um processo falando que cometeu um erro e
aí tem que esperar o juiz reconhecer o erro e obrigar quem recebeu errado a
devolver”, detalha o advogado.
“Basicamente, o juiz precisa comparar o que deveria ter sido
feito com os dados da transferência, aí marca uma audiência no Juizado de
Pequenas Causas e a parte que recebeu vai ter que explicar a origem do
dinheiro, se defender. Se for caso de erro, não tem jeito, ela vai
acabar tendo que devolver”, continua.
Recebi um PIX errado. Tenho que devolver?
A resposta é “imediatamente”, para o consultor do Banco
Central. Ele explica que o próprio PIX possui um botão “devolver”, para
estornar rapidamente um valor recebido por engano.
“Não precisa saber nenhuma informação de quem mandou o PIX. É
só devolver. É imediato, instantâneo. Quem recebe PIX errado e tiver boa-fé vai
fazer isso”, afirma Breno.
De acordo com o advogado Solano, dependendo do caso, receber
um PIX e não devolver o valor pode configurar apropriação indébita.
“A pessoa que recebe um PIX, que sabe que não foi para ela e
mesmo assim não devolve pode ser processada no âmbito civil e criminal. O
problema, no criminal, é que apropriação indébita dá de 1 a 4 anos de
prisão”, alerta.
Caí em um golpe! Vou ver meu dinheiro de novo?
Para casos de golpe envolvendo PIX, o Banco Central conta com
uma ferramenta chamada Mecanismo Especial de Devolução (MED). Por
meio dele, o banco inicia um procedimento para analisar a fraude e, se
possível, devolver o valor.
“O mais rápido possível, assim que detectar que sofreu o
golpe, entre em contato com seu banco e reporte o problema. Tenha sempre o
comprovante do PIX em mãos, que vai ter informações importantes sobre quem
recebeu o golpe”, orienta o consultor do BC.
Segundo Lobo, o primeiro passo precisa ser entrar em contato
com o banco para que a instituição consiga iniciar o MED e bloquear o
valor da conta do fraudador, antes que ele saque o dinheiro ou o
transfira para outro lugar.
“Ao iniciar o processo, o banco da pessoa que sofreu o golpe
entra em contato com o BC e a gente compartilha essa informação, então o banco
do fraudador precisa bloquear os recursos da conta dele, até o valor da fraude.
Às vezes não tem nada e não tem como bloquear”, conta.
A partir disso, o banco do fraudador tem até sete dias para
analisar o caso. O consultor explica que o MED não se aplica em casos de
desacordos comerciais, ou de compra e recebimento de produtos errados, por
exemplo.
“Mas se o banco do fraudador observar que de fato a transação
foi por fraude e concorda com o pedido de devolução, o banco retira
recursos do fraudador e devolve para o usuário pagador”, conclui Lobo.
O consultor acrescenta ainda que o banco do fraudador
não tem a responsabilidade de usar recursos próprios para pagar a vítima do
golpe. Por isso, caso a conta do fraudador não tenha dinheiro, o valor não
poderá ser devolvido pelo MED e o usuário precisará acionar a Justiça.
É melhor prevenir do que remediar…
Antes que tudo isso aconteça, o advogado Solano de Camargo
separou três dicas para você evitar fazer transferências erradas.
1. Checar as informações do recebedor
Antes de confirmar a transferência, o usuário precisa checar todos os
dados da pessoa que vai receber o PIX, como o nome, CPF ou CNPJ e agência
bancária. A dica é ainda mais importante em caso de PIX por QR Code, já que as
pessoas tendem a escanear o código e não conferir as informações de envio que
aparecem na sequência.
2. Sempre fazer o PIX pelos canais
oficiais do banco
É imprescindível que a pessoa sempre realize as transferências pelo site
ou aplicativo oficial do banco dela. A orientação é não fazer
PIX diretamente a partir de links recebidos por SMS, WhatsApp ou qualquer outro
canal de mensagens.
3. Ficar atento ao fazer compras online
Neste caso, os dados do PIX estão “corretos”, mas a própria loja pode ser
falsa. Por isso, antes de fazer uma compra pela internet, deve-se checar se a
loja é confiável. O ideal é dar preferência a sites conhecidos e com
avaliações positivas de vários usuários.
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