Caso Hyara Flor: entenda o que pode acontecer com criança de 9 anos suspeita de matar cigana com tiro acidental

Advogado e Vice-presidente de Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-BA explicou consequências para a criança e para a família dela.

 

Hyara Flor no dia do seu casamento — Foto: Redes sociais

O inquérito policial que concluiu que a adolescente Hyara Flor foi morta pelo cunhado de 9 anos, com um disparo acidental, mudou o cenário do caso. O homicídio cometido em Guaratinga, no sul da Bahia, teve repercussão nacional, pois acreditava-se que o marido da vítima, que tem 14 anos, era o responsável pelo tiro.

No Brasil, as crianças não podem responder por crimes. Por isso, o g1 conversou com o vice-presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil na Bahia (OAB-BA), Marcus Vinícius Magalhães, para entender quais consequências a criança e a família dela podem sofrer em casos como este.

A criança pode sofrer medida socioeducativa?

Não, a criança não pode ser apreendida, nem cumprir medidas socioeducativas. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), apenas adolescentes de 12 anos ou mais podem passar por esse tipo de medida.

Em contextos como o do cunhado de Hyara Flor, a criança com menos de 12 anos recebe medidas protetivas, pois o ECA entende que ela não tem maturidade o suficiente para entender o crime que cometeu.

"Alguém vai ser responsabilizado por isso, mas a criança vai ser encaminhada para o acompanhamento especializado. Ela [criança] está vivenciando um contexto de violência, onde ela é apontada como agressora", explicou o advogado Marcus Vinícius Magalhães.

Quais sanções a criança poderá sofrer?

As crianças acusadas da prática de ato infracional devem receber uma série de medidas protetivas, que não têm o caráter de responsabiliza-la, mas sim de protegê-la. Essa proteção engloba não só o âmbito psicológico, mas também a segurança e a educação, por exemplo.

"Essa criança pode ter perda de rendimento escolar, pode sofrer perseguições na comunidade em que vive, bullying... Ela pode se tornar uma vítima", disse Magalhães.

As medidas protetivas funcionam como uma espécie de acompanhamento, que varia a depender da necessidade de cada criança. Normalmente, o Conselho Tutelar aciona o Centro de Referência de Assistência Social (CREAS), que tem serviços especiais para crianças e adolescentes em contexto de violência.

Nessa vertente, são criadas ações estruturadas no âmbito familiar, psicológico, escolar e até de segurança para assegurar a integridade física e psíquica dessa criança. Segundo Marcus Vinícius Magalhães, não existe prazo para que a criança seja liberada desse acompanhamento.

Os responsáveis podem responder pelo crime?

 

Sim, os responsáveis da criança podem responder pelo crime e inclusive serem presos. No caso Hyara Flor, a mãe da criança - a sogra da vítima - foi indiciada por homicídio culposo e porte ilegal de arma de fogo, considerando que a pistola utilizada no crime pertencia a ela.

Mesmo se a mulher tivesse o registro de porte de arma de fogo, ela poderia responder pelo crime, por "ter dado causa ao homicídio".

"Quem detém o porte se responsabiliza pelo porte e pelos danos que possam vir a ser causados. Ainda que não tenha sido um crime doloso (quando há a intenção de matar), há a responsabilização", detalhou o advogado.

Ainda segundo o especialista, esse é uma situação de negligência, ou seja, houve descuido, indiferença ou desatenção em uma conduta. Nesse caso, a negligência foi deixar uma arma de fogo carregada no alcance de uma criança.

Após a finalização do inquérito, o Ministério Público precisa acompanhar a criança?

Sim, por tratar-se de uma criança, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) acompanha todas as etapas, inclusive após a conclusão do inquérito.

Isso acontece porque o processo judicial ainda vai tramitar e a criança poderá, inclusive, ser ouvida novamente.

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