Advogadas de Luciano Ribeiro Bueno
afirmaram que caso aconteceu quando professor passava por problemas
psicológicos e disseram que devem levar à análise da Justiça o decreto de
demissão.
O professor Luciano Ribeiro Bueno,
do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG),
foi demitido por assédio sexual contra uma acadêmica após a conclusão de um
Processo Administrativo Disciplinar (PAD).
De acordo com o relatório final do
processo, ao qual o g1 teve acesso, o docente cometeu o
assédio sexual em julho de 2022, por meio de mensagens escritas, áudios e
vídeos.
A acadêmica denunciou o caso à Ouvidoria
da UEPG. A demissão foi publicada em 9 de agosto de 2023 no Diário Oficial do
Paraná.
Em uma das mensagens de áudio, ele
perguntou o que a estudante queria para fazer sexo com ele.
"O que você que pra m**e gostoso comigo? E dai, o que você que. Diga
ai"
As advogadas de Luciano disseram
que não houve provas que o professor agiu "no sentido de se valer de seu
cargo para ofender a aluna em questão".
Segundo a defesa, o caso aconteceu
em um momento em que o professor passava por problemas psicológicos, como “transtorno
depressivo grave e Síndrome de Burnout”, que levaram ele a “interpretar
equivocadamente as mensagens trocadas com sua aluna fora do ambiente de sala de
aula”.
Por meio de nota, as advogadas
afirmam que devem levar à análise da Justiça o decreto de demissão do
professor.
A vítima disse que prefere não se
manifestar sobre o caso porque "já está tudo resolvido".
Conforme o processo, Luciano estava
afastado desde agosto de 2022. Quando enviou as mensagens, ele era chefe
adjunto do Departamento de Economia, com vencimentos de R$ 10.959,38.
Mensagens começaram com oferta de
'ajuda'
Luciano Ribeiro Bueno era professor
colaborador da UEPG desde 2003. Em 2012, foi admitido como professor de
carreira e, de 2016 a 2020, foi chefe do Departamento de Economia.
O contato do professor com aluna,
por meio do WhatsApp, começou na madrugada de 21 de julho de 2022, com duas
mensagens. Ele as apagou e, pela manhã, enviou novas mensagens se apresentando.
Conforme a conversa avança, ele
questiona o motivo dela não estar indo para aula.
Depois, ele disse que ela tirou
nota baixa em um trabalho e ofereceu a possibilidade de a acadêmica refazê-lo.
Afirmou, também, que poderia passar as questões via WhatsApp.
Ela respondeu: "Entendi
professor".
Prints das conversas trocadas por meio de aplicativo constam no relatório — Foto: Reprodução/Relatório Comissão PAD UEPG
À noite, o professor retoma a
conversa e pergunta novamente se ela gostaria de receber as questões. Após não
ter resposta, ele disse para a aluna que ela o deixa excitado.
“Você sempre olha nos meus olhos. Olha o status. Vai gostar. Vai querer a
chance? [...] Deixa prof de r**a dura. Vamos sair? O que quer? Vamos
marcar?".
Prints de conversa entre professor e aluna — Foto: Reprodução/Relatório PAD UEPG
Meia hora depois, a aluna respondeu
pedindo para o homem confirmar a identidade em áudio. Ele responde, confirma, e
sugere novamente que ela olhe o status dele no WhatsApp.
Nele, o homem exibia o órgão
genital, mensagem que podia ser vista por todos os contatos.
Nos áudios, Luciano também convidou
a aluna a ter relações sexuais com ele, perguntando o que ela queria em troca
de sexo. Após enviar uma sequência de áudios, a aluna respondeu:
“Por um acaso em algum momento eu dei liberdade pro senhor me mandar esse
tipo de vídeo, e me fazer esse tipo de proposta?”.
Mensagens enviadas pelo docente à aluna têm cunho sexual, conforme relatório — Foto: Reprodução/Relatório Comissão PAD UEPG
Veja, abaixo, os prints das
mensagens e as transcrições dos áudios. Os números dos celulares e palavras com
tom pejorativo foram borrados:
Vítima registrou áudios e mensagens com conteúdo sexual em ata no cartório — Foto: Reprodução/Relatório PAD UEPG
Conforme o Processo Administrativo
Disciplinar, as mensagens com teor sexual foram enviadas entre 23h23 e 01h29.
Elas foram verificadas pela comissão responsável e registradas em cartório.
Após ser confrontado pela aluna,
Luciano pediu desculpas e a conversa foi encerrada às 2h34, quando a aluna
bloqueou o contato dele.
Professor disse que interpretou
'sinais corporais' da aluna
Em depoimento, de acordo com o
relatório do Processo Administrativo Disciplinar, o professor "não negou
os fatos, mas acrescentou que tudo ocorreu porque interpretou os olhares e
sinais corporais da aluna de forma equivocada".
Ainda no depoimento, o docente
afirmou que enviou as mensagens em um momento que estava passando por crises de
ansiedade e justificou "que as fotos não foram enviadas diretamente a
ela".
Trâmite até demissão durou um ano
Conforme apurado pelo g1,
o processo contra o professor Luciano Ribeiro Bueno levou cerca de um ano.
No relatório do Processo
Administrativo Disciplinar, a comissão responsável cita a "gravidade da
descompostura do servidor" a partir da avaliação da denúncia e também
frente ao fato dele não ter negado a ação. A comissão era formada por duas
professoras e um professor.
Quanto à penalidade, os integrantes
da comissão divergiram. Dos três professores que participaram da investigação
interna, dois sugeriram suspensão por 60 dias e um opinou pela demissão.
A docente que discordou dos colegas
afirma que o professor, ao justificar a conduta sob "o argumento de que
interpretou mal os olhares da vítima", acabou culpando a vítima.
Para a professora que integrou a
comissão, "a punição no caso deve ter um escopo não somente punitivo, mas
também pedagógico, de modo a acenar para toda a comunidade universitária que a
UEPG não compactua com comportamentos dessa natureza".
O reitor da universidade, Miguel
Sanches Neto, solicitou um parecer jurídico diante da discordância dos
componentes da comissão.
A opinião da Procuradoria Jurídica
da UEPG era para que o professor fosse exonerador. Segundo o parecer, "o
convite expresso em áudio e mensagens para ceder a favores sexuais, em troca de
possível atribuição de nota", é uma prova de que o docente assediou
sexualmente da estudante.
Ainda para a Procuradoria Jurídica,
o argumento da defesa do professor de que ele estava "com o estado
emocional alterado não foi suficientemente comprovado para afastar a gravidade
da conduta cometida".
O caso avançou para demissão de
Luciano após o vice-reitor da UEPG na ocasião, Ivo Mottin Demiate, deliberar
sobre o assunto.
No despacho que consta no Processo
Administrativo Disciplinar, Demiate não acatou o relatório final, mas sim as
razões apresentadas pela professora que discordou dos outros integrantes em
relação à penalidade, e decidiu pela demissão do servidor.
Veja um resumo do processo abaixo:
- 21 e 22 de julho de 2022:
Luciano manda as mensagens;
- 2 de agosto de 2022: Aluna
denuncia caso na ouvidoria da UEPG;
- 3 de agosto de 2022:
Chefia do Departamento de Economia sugere afastamento temporário dele;
- 4 de agosto de 2022: Reitoria
autoriza abertura do Processo Administrativo Disciplinar (PAD);
- 8 de agosto de 2022:
Professor é afastado;
- 18 de novembro de 2022:
Comissão recomenda suspensão do professor por 60 dias após ouvir defesa;
- 18 de novembro de 2022:
Presidente da comissão opina pela demissão de Luciano, mas diz que teve
voto vencido;
- 6 de dezembro de 2022:
Jurídico da UEPG diz que decisão cabe à reitoria;
- 13 de dezembro de 2022: Vice-reitor
assina a portaria de demissão;
- 5 de abril de 2023:
Despacho da demissão é enviado à Procuradoria do Paraná. Conselho
Universitário reiterou a decisão pela demissão;
- 13 de abril de 2023:
Procuradoria dá parecer positivo ao ato;
- 9 de agosto de 2023:
Governo Estadual decreta demissão de Luciano Ribeiro Bueno.
Demissão do professor demorou
quatro meses após ser definida
Quatro meses se passaram entre a
decisão da Procuradoria do Paraná em exonerar Luciano, em abril de 2023, e a
publicação da demissão em Diário Oficial, em agosto deste ano.
Segundo o Portal da Transparência,
apenas neste período, os vencimentos de Luciano somaram R$ 43.837,52.
Em contato com o
Governo do Estado questionando sobre o intervalo de tempo entre a decisão e a
demissão mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
Professor também responde na
Justiça
O professor também respondeu
criminalmente pelo ato.
Conforme o Ministério Público
(MP-PR), em audiência realizada em 27 de junho de 2023, Luciano aceitou a
aplicação antecipada da pena restritiva de direitos de prestação pecuniária –
ou seja, pagamento em dinheiro à vítima.
O valor acordado não foi revelado
porque o processo tramita em sigilo. Segundo o MP, ele aguarda intimação da
Justiça para fazer o pagamento.
O que diz a universidade
Em nota, a UEPG destacou que a
investigação interna do caso foi realizada por comissão de professores
efetivos, conforme legislação estadual que estabelece normas e procedimentos
especiais sobre atos e processos administrativos que não tenham disciplina
legal específica.
Questionada se professores podem
contatar alunos por redes sociais sobre assuntos acadêmicos, a UEPG disse que
contatos extra aula estão disponíveis por "e-mail institucional;
ferramentas em plataformas online da educação à distância, como fóruns e chats,
e Google Workspace".
Em nota, a UEPG disse que apura,
atualmente, outras 11 denúncias de assédio sexual:
- 2 inquéritos disciplinares;
- 2 procedimentos administrativos para apuração de
responsabilidade;
- 3 processos administrativos;
- 4 sindicâncias.
O que diz a defesa
Confira a íntegra da manifestação
da defesa do professor:
"O Sr. Luciano Ribeiro Bueno,
desde sua admissão em 27 de setembro de 2012 ao quadro de servidores da
Universidade Estadual de Ponta Grossa, sempre cumpriu com máxima diligência o
seu dever laboral, em estrita observância aos princípios éticos e morais,
resultando em aprovação em estágio probatório e irretocável histórico
funcional.
Nesta última década de dedicação
exclusiva à Universidade, adotou conduta proba e íntegra perante seus
superiores, pares e alunos, inexistindo qualquer antecedente ou relato em
sentido contrário desabonador de sua integridade na esfera profissional ou
particular.
Esclarece que a conduta narrada na
denúncia ocorreu em momento extremamente delicado da sua vida particular, em
decorrência de luto familiar no contexto da pandemia da Covid-19 e agravamento
de doença crônica (Retocolite Ulcerativa Aguda), passando a desenvolver
transtorno depressivo grave, bem como transtornos de adaptação decorrente de
quadros de Estresse Pós-Traumático e Síndrome de Burnout, os quais vem tratando
desde o ano de 2020.
Estas circunstâncias, devidamente
documentadas no processo administrativo que culminou em sua demissão, para além
do uso excessivo de medicamentos capazes de alterar a psique, contribuíram
sobremaneira para o estado de perturbação emocional e transtorno de conduta
que, na data de 21 de julho de 2022, o levou a interpretar equivocadamente as
mensagens trocadas com sua aluna fora do ambiente de sala de aula,
ultrapassando os limites de respeito que deve pautar as relações entre aluno e
professor, bem como entre homem e mulher.
Em momento algum restou corroborado
no processo administrativo disciplinar que o Sr. Luciano agiu de forma
deliberada no sentido de se valer do seu cargo de professor para ofender a
aluna em questão ou mesmo a instituição que representa, tendo apresentado
diversos elementos que denotam as circunstâncias fáticas supra mencionadas, bem
como arrependimento por uma conduta manifestamente isolada e que de forma
alguma corresponde ao seu costumeiro agir.
No entanto, a capitulação dada ao
fato pela autoridade sancionadora desconsidera o conjunto probatório do
processo administrativo, o qual indica de forma cabal as circunstâncias
atenuantes e bons antecedentes, bem como imediato arrependimento e pedido de
desculpas à aluna, motivando a pena de demissão com fulcro apenas a gravidade
em abstrato da conduta tipificada como assédio sexual no Código Penal.
Desta forma, verifica-se o
afastamento da autoridade sancionadora aos princípios basilares da
Administração Pública, notadamente no que concerne à proporcionalidade,
razoabilidade, individualização da pena e adequação punitiva, pelo que está
tomando as providências cabíveis a fim de submeter o decreto à análise do Poder
Judiciário, direito conferido pelo art. 5°, XXXV, da Constituição Federal.
Esclarece, por fim, que a denúncia
foi encaminhada ao Ministério Público do Paraná para a apuração dos fatos na
esfera criminal, resultando em acordo entre as partes a fim de reparar, de alguma
forma, a dignidade e a honra da vítima, à qual, reitera-se, jamais teve a
intenção de ofender".
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