Durante a audiência o magistrado interrompeu a mãe, enquanto
ela respondia perguntas da promotora, e disse que ela deveria ter
"inteligência emocional" naquele momento.
O juiz Wladimir Perri, da 12ª Vara Criminal de Cuiabá, deu
voz de prisão para a mãe de um jovem assassinado a tiros, em 2016, depois que
ela se expressou contra o acusado do crime, durante uma audiência de instrução,
realizada no dia 29 de setembro. O caso, no entanto, só ganhou repercussão após
o trecho da audiência ser divulgado nas redes sociais. (assista
abaixo)
De acordo com a promotora do caso, Marcelle Rodrigues da
Costa e Faria, tudo começou quando foi perguntado à mãe se ela estava
confortável em prestar depoimento na frente do réu. “Achei que se retirasse ele
da sala, talvez ela ficasse mais tranquila em prestar o depoimento. Nesse
momento, ela mostra coragem e diz que não teria problema ele acompanhar, pois o
reú não era ninguém pra ela".
Logo pós a fala da mulher, o advogado do réu interviu
pedindo respeito ao acusado e, em seguida, o juiz passa a repreender a mãe.
“O juiz exigiu um comportamento daquela senhora, sem
compreender a situação que ela estava. Então ,eu intervi de novo, dizendo que
eu queria ouví-la, mas novamente o juiz exigiu da vítima inteligência
emocional. Novamente, pedi que a vítima pudesse contar a história dela, mas o
juiz não quis e encerrou a audiência”, narrou.
Quando a audiência foi encerrada, a mãe do jovem assassinado
se levantou e jogou um copo de plástico que ela segurava. Em seguida, segundo a
promotora, ela se voltou ao réu e disse: "da justiça dos homens
você escapou, mas da justiça Deus não escapa".
“Na ata da audiência, o juiz disse que a mulher, no momento
que jogou o copo, danificou patrimônio público, quebrando o bebedouro, mas como
um copo de plástico quebra um bebedouro?" questionou. Além disso, na ata
também constava que ela xingou o magistrado, mas também não ficou comprovado”,
disse a promotora.
Após receber voz de prisão, a mulher permaneceu no fórum por
mais quatro horas depois que a sessão foi encerrada, pois, segundo Marcelle, o
juiz só lançou a ata no sistema às 20h.
Depois da audiência, a mãe foi levada para a delegacia e
prestou depoimento.
“O delegado não lavrou flagrante, pois concluiu que não havia
provas. Ela não teve liberdade de expressão, não foi ouvida. Isso doeu no meu
coração", concluiu a promotora.
Apoio emocional e direito
A psicóloga Giovana Bárbara Neves Lourenço, explicou que no
estado há o Núcleo de Defesa da Vida, instituição responsável para atender
familiares e vítimas sobreviventes de crimes dolosos conta vida.
“A Promotoria de Justiça oferece a denúncia contra o réu, e a
partir do processo, eles encaminham para a gente o pedido de estudo psicológico
e social. Quando chega aqui, verificamos quem são as vítimas, os familiares
dessas vítimas e entramos em contato com essas pessoas para informá-las sobre
seus direitos", explicou.
Segundo Giovana, as vítimas são orientadas sobre os direitos
que possuem, para que elas não sofram revimitização durante o curso do
processo.
"A pessoa é informada que aqui é um espaço de fala para
ela. Então, não tem certo e errado, não tem censura. Ela fala sobre a dor
dela a partir da perspectiva dela. E aí a gente também informa sobre outras
questões que podem intensificar esse sofrimento durante o andamento processual,
como pedir para depor na ausência do réu, caso se sinta temerosa ou não
tenha condições de estar no mesmo ambiente que a pessoa. É um direito",
explicou.