Polêmica aconteceu depois que oficial emitiu certidão dizendo
que chamou pelo morto "duas ou três vezes" e atestou que estava
morto. Juiz mandou corregedoria investigar o oficial de justiça.
Fórum de gurupi — Foto: TJ/Reprodução
O juiz Baldur Rocha Giovannini e o oficial de justiça Cácio
Antônio de Oliveira têm remuneração bruta de mais de R$ 40 mil por mês, cada
um. Os dois estão no centro de uma polêmica envolvendo o judiciário do
Tocantins após o magistrado dar a ordem para intimar uma vítima de assassinato
e o oficial ir ao cemitério pessoalmente para chamar pelo falecido.
Levantamento feito pelo g1 no portal da transparência do
Tribunal de Justiça mostra o rendimento de ambos, que chegam a ganhar bem mais
que o próprio governador do estado.
Baldur Rocha Giovannini é juiz desde 2009 e atualmente está
lotado na 1ª Vara Criminal da comarca de Gurupi, que possui status de 3ª
entrância - as comarcas são divididas em três entrâncias e quanto maior o grau,
maior é a remuneração. O salário base dele é de R$ 35.710,46.
Rendimentos brutos de Baldur Rocha Giovannini nos três
últimos meses:
- Julho:
R$ 47.529,67
- Agosto:
R$ 50.325,23
- Setembro:
R$ 46.686,72
O oficial de Justiça Cácio Antônio de Oliveira ocupa o cargo
desde 2002 e atualmente está lotado na mesma comarca que o juiz, mas na central
de mandados. O subsídio base dele é de R$ 36.629,76.
Rendimentos brutos de Cácio Antônio de Oliveira nos três
últimos meses:
- Julho:
R$ 40.962,33
- Agosto:
R$ 40.962,33
- Setembro:
R$ 40.962,33
Além dos descontos com Imposto de Renda e contribuição
previdenciária, entre outros, os dois tem redução do salário pelo teto
constitucional.
Intimação de morto
Segundo certidão, oficial teria tentado cumprir intimação no cemitério da cidade — Foto: Google Earth
A polêmica começou depois do julgamento de um réu pelo
latrocínio de Francisco de Assis Sousa. O crime aconteceu no dia 29 de abril de
2022 em Dueré, no sul do estado. Dois homens participaram do crime.
Passado um ano e cinco meses do assassinato, um dos réus foi
condenado a 21 anos de prisão. Logo após o resultado do julgamento, no dia 26
de setembro, foi assinado eletronicamente um mandado para cumprimento da
intimação em nome da vítima morta.
No dia 4 de outubro, a Central de Mandados de Gurupi emitiu a
curiosa certidão atestando que o oficial de justiça Cácio Antônio foi ao
endereço da vítima, em Dueré. Chegando lá, conforme o documento, o servidor
afirma que recebeu a informação de que a vítima 'reside no cemitério local'.
O oficial de justiça relatou então que foi ao cemitério,
chamou duas ou três vezes pelo nome e até pelo apelido da vítima. Ao fim,
confirmou o esperado: 'que o intimando encontra-se mesmo "morto"'.
Por esse fato, deixou de proceder a intimação. (Veja no documento abaixo)
Certidão atestando que o oficial de Justiça tentou cumprir de intimação em cemitério — Foto: Divulgação
Depois que a polêmica chegou à imprensa, um novo documento do
juiz Baldur foi incluído no processo determinando que a Corregedoria e a
Diretoria local do Fórum investiguem a conduta do oficial de justiça.
Um dos pontos do documento cita que a certidão gerou
desconforto e qual seria a conduta correta do oficial de justiça:
- Considerando a certidão do Oficial de Justiça
acostado ao evento 88;
- Considerando que a sentença acostada ao
evento 84 foi explícita em determinar a intimação da vítima, se houvesse,
ou o CADE (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão) para que, querendo,
execute perante o Juízo Cível, o dispositivo da sentença que condenou o
acusado ao pagamento da indenização mínima;
- Considerando que não tem nenhuma decisão para
o oficial de justiça intimar ninguém morto em cemitério e que isto não é
de praxe no Judiciário;
- Considerando a ampla divulgação da referida
certidão, que trouxe claro desconforto para este juízo;
- Considerando ainda que a conduta correta
seria de, no máximo, ter ido ao cartório e ter pegado segunda via da
certidão de óbito e no mínimo intimar o CADE (cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão, conforme determinado;
O que diz o Tribunal de Justiça
Em nota, o Tribunal de Justiça informou que de acordo com o
juiz, 'não foi expedido nenhum mandado de intimação para pessoa morta' e que 'a
atitude do oficial de justiça deverá ser apurada por órgão competente'. Porém
há o pedido na decisão e um mandado expedido para o cumprimento da intimação da
vítima. (Veja a imagem abaixo)
O g1 entrou em contato com o Sindicato dos
Oficiais de Justiça do Tocantins, mas não obteve posicionamento até o
fechamento desta reportagem.
O oficial Cácio Antônio também foi procurado pela reportagem
para dar a versão do ocorrido. Respondeu apenas que "falará em momento
oportuno". Ele também foi questionado pela reportagem sobre o pedido de
apuração da conduta na Corregedoria, mas não se posicionou.
Mandado para intimar a vítima de latrocínio — Foto: Reprodução |