Compras em sites estrangeiros como Shein e Shopee devem ser taxadas por novo imposto

Operações de até US$ 50 também pagarão IVA quando pacote começar a valer a partir de 2026

 


A regulamentação da reforma tributária proposta pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prevê a taxação das compras realizadas por meio de plataformas digitais, incluindo internacionais como Shein e Shopee.

Por outro lado, os consumidores devem sentir um alívio na aquisição de alimentos —mesmo aqueles que ficaram fora da Cesta Básica Nacional, isenta de cobrança. Famílias de baixa renda ainda terão parte do tributo pago devolvido por meio do chamado "cashback".

Os detalhes do projeto que regula o funcionamento do novo sistema tributário a partir de 2026 foram apresentados nesta quinta-feira (25) pelo Ministério da Fazenda.

O governo afirma que adotou como premissa a tentativa de tornar o sistema mais progressivo, isto é, cobrar mais de quem tem renda mais elevada e aliviar a carga de quem ganha menos.

Pelo projeto, as compras de produtos ou serviços realizadas por meio de plataformas digitais serão tributadas pelo novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado) a partir de 2026, quando os novos tributos começam a valer.

A cobrança deve valer para todas as plataformas online, sediadas no Brasil ou no exterior, e alcançará compras de todos os valores, inclusive aquelas de até US$ 50 feitas por pessoas físicas.

A Receita Federal tem hoje o programa Remessa Conforme. O programa isenta de Imposto de Importação as remessas de até US$ 50 destinadas a pessoas físicas, além de dar prioridade a esses bens no despacho aduaneiro. Essas compras também são livres de PIS/Cofins. Em contrapartida, a companhia se compromete a seguir as regras do fisco.

Os estados, por sua vez, aplicam uma cobrança do ICMS de 17%.

Quando a reforma entrar em funcionamento, as compras internacionais terão que recolher os dois novos tributos, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) de estados e municípios e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) federal.

As novas regras não mexem no Imposto de Importação, tributo que não foi abarcado pela reforma e que permanece zerado para as compras internacionais até US$ 50.

O secretário extraordinário de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, disse que não se trata de criar um tributo novo sobre essas remessas, mas reconheceu que a medida pode resultar em aumento das cobranças sobre essas compras.

Hoje, a alíquota de 17% do ICMS é cobrada sobre o preço cheio, que já embute os tributos cobrados sobre o bem. O cálculo "por fora", apenas sobre o valor do produto, resultaria em uma incidência de 20,5% —abaixo da alíquota média do novo IVA, calculada em 26,5%.

"A diferença em relação ao que é hoje é pequena. Vai ser uma cobrança muito parecida", disse.

O secretário ressaltou ainda que os estados discutem hoje elevar a cobrança de ICMS sobre as remessas para 25%, o que, segundo ele, seria o mesmo que uma alíquota "por fora" de 33%. "É mais do que vamos tributar. Dependendo do que os estados fizerem, podemos ter até uma redução", afirmou.

Segundo Appy, as empresas domiciliadas no exterior terão que fazer o registro no Brasil para fazer o pagamento do tributo. Se elas não efetuarem o pagamento, o comprador no Brasil terá que fazê-lo.

O auditor fiscal da Receita Federal Roni Petterson Brito, que participou da elaboração da proposta, assegurou que o registro será muito simplificado, como ocorre nos outros países.

CESTA BÁSICA

O governo estabeleceu uma lista enxuta de 18 categorias de produtos da Cesta Básica Nacional, que serão integralmente desonerados dos novos tributos.

Os produtos foram listados considerando a diversidade regional e cultural da alimentação do país e garantindo uma alimentação saudável e nutricionalmente adequada, exigências previstas na emenda constitucional da reforma.

A prioridade foi incluir os alimentos mais consumidos pela população mais pobre para assegurar que o máximo possível do benefício tributário seja apropriado pelas famílias de baixa renda.

A lista inclui desde o tradicional arroz e feijão (dois dos alimentos mais consumidos pelos brasileiros), além de coco, grãos e farinha. Mas o governo deixou de fora todos os tipos de proteína animal, o que inclui carnes e laticínios.

Mesmo fora da lista de produtos da cesta com alíquota zero, as carnes terão alívio na tributação, segundo o governo. Elas serão alvo da alíquota reduzida, equivalente a 40% da padrão (o que resulta numa cobrança de 10,6%, caso a estimativa do governo se confirme).

"As carnes já estão sendo desoneradas", disse Appy, citando o exemplo da picanha, frequente nos discursos de Lula desde a campanha eleitoral de 2022.

Cálculos apresentados pelo governo apontam que a tributação da carne pode cair dos atuais 12,7% para 8,5%, no caso da população de baixa renda com direito ao cashback. Para os demais, a cobrança será de 10,6%.

A exclusão das carnes da Cesta Básica com alíquota zero tem sido criticada por setores do agronegócio e supermercados, que defendiam uma lista mais ampla. O governo justificou a decisão com o argumento de que incluir esses artigos levaria a um "choque" na alíquota média de referência cobrada sobre os demais bens e serviços.

A alíquota subiria 0,7 ponto percentual, alcançando 27,2% —superando o atual maior IVA do mundo, na Hungria (27%).

A lista de produtos da cesta básica estendida, com alíquota reduzida, incluiu as carnes bovinas, suína, ovina, caprina e de aves, produtos de origem animal, além de peixes, carnes de peixes e crustáceos. Até o camarão ficou na lista de produtos com taxação menor, pois em alguns estados ele é um alimento popular, consumido pela baixa renda.

Foram excluídos da lista os produtos de origem animal considerados de luxo, como foie gras, atuns, bacalhaus, caviar e lagosta.

CASHBACK

Além dos benefícios da Cesta Básica, as famílias de baixa renda terão direito à devolução de uma parcela do tributo pago sobre o consumo, mecanismo conhecido como "cashback". Terão acesso ao benefício as famílias com renda per capita de até meio salário mínimo (hoje, o equivalente a R$ 706) inscritas no Cadastro Único de programas sociais.

O governo estima que o público potencial da medida será de 28,8 milhões de famílias ou 73 milhões de pessoas, cerca de um terço da população brasileira.

O texto prevê a devolução de 100% da CBS e 20% do IBS na aquisição do gás de cozinha em botijão.

Na conta de luz, água, esgoto e gás natural, o cashback será de 50% da CBS e 20% do IBS —nesses casos a devolução será dada já no momento da cobrança da operação, ou seja, em forma de desconto na própria fatura.

Nos demais casos, como compras de supermercado e outras, valerá o percentual de 20% para ambos os tributos.

União, estados e municípios poderão fixar percentuais mais elevados, caso assim o desejem, desde que limitado a 100% do tributo.

MEDICAMENTOS

O projeto ainda definiu uma lista com medicamentos que terão alíquota zero do IBS e da CBS, o que inclui aqueles oferecidos pelo programa Farmácia Popular do governo.

Nessa lista, o que chama atenção é o Viagra (citrato de sildenafila), indicado para tratar disfunção erétil, mas que também é usado contra distúrbios pulomares.

Uma segunda lista contém 850 tipos de medicamentos que terão tributação reduzida em 60%. Entre eles está o botox, nome popular da toxina botulínica, substância química que atua impedindo a contração dos músculos e é muito usado por pacientes que buscam reduzir rugas e linhas de expressão.

Segundo a diretora de programa do Ministério da Fazenda Camilla Cavalcanti, as listas foram feitas com apoio do Ministério da Saúde e incluem redução da tributação também para serviços de saúde, dispositivos médicos, higiene pessoal e limpeza, além de cuidados básicos à saúde menstrual.

As listas são mais abrangentes do que os benefícios que existem hoje com PIS, Cofins e ICMS. Elas incluem respiradores, equipamentos de ressonância magnética e ultrassom.

"Teremos uma redução bastante relevante da tributação de medicamentos não só porque tinha muita cumulatividade [pagamento de tributo sobre tributo], como também pela sua ampliação [da lista]", disse Appy.

A reforma ainda prevê uma via rápida (fast track) para promover a atualização anual da lista de medicamentos e também no caso de emergências, como ocorreu com a pandemia da Covid-19.

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