Dono de loja de celular atirou contra suspeito, que também estava armado. Polícia entendeu que comerciante agiu para se defender e, por isso, não responderá criminalmente.
O dono de uma loja de celulares no Paraná que reagiu a um
assalto e deu cinco tiros no suspeito não responderá criminalmente pelos
disparos porque a polícia entendeu que ele agiu em legítima defesa. Por lei, há
cinco requisitos para que a reação seja interpretada dessa forma.
O assalto aconteceu na semana passada em Ponta Grossa, nos
Campos Gerais. O suspeito estava armado e foi internado em estado grave.
O Código Penal trata do assunto no artigo 23, que afirma não
haver crime quando o fato é praticado em legítima defesa, em estado de
necessidade ou "em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício
regular de direito".
A Polícia Militar recomenda que as vítimas não reajam e
acionem a corporação por telefone ou aplicativo, descrevendo características do
suspeito e informando horário e local do crime.
O advogado criminalista Gustavo Scandelari explica que a
legislação considera legítima defesa quando:
- há
uma reação a uma agressão injusta;
- a
agressão injusta está ocorrendo ou é iminente;
- a
agressão acontece contra a pessoa que se defendeu ou terceiros;
- a
reação foi feita com os meios necessários para repelir a agressão;
- a
reação é moderada.
Scandelari ressalta que os cinco requisitos devem ser
cumpridos para que a pessoa que reagiu não responda criminalmente.
Se um assaltante está portando uma arma branca ou está
desarmado, por exemplo, atirar contra ele é considerado crime, "porque
embora aquele meio de defesa seja um meio disponível, ele é um meio
desproporcional para repelir a ameaça", exemplifica.
"O entendimento da jurisprudência, da literatura
majoritária, é que a vítima não poderia já fazer os disparos de pronto. Uma
atitude que seria vista como possivelmente legítima defesa seria se a vítima
saca a arma de fogo, aponta e desarma o agressor, tentando não fazer
disparos", explica.
Reação moderada
O advogado também destaca que, para ser considerada legítima
defesa, a reação deve ser considerada moderada. Essa avaliação, segundo o
criminalista, será feita na investigação por meio de laudos periciais.
"Tem que se verificar as habilidades do atirador,
daquele que reagiu, porque se pode exigir mais de quem pode mais. Se você tem
ali um exímio atirador, alguém que tem técnicas de autodefesa com arma de fogo
- um policial, por exemplo, um agente de segurança pública que tem treino para
isso - você pode exigir dele que num cenário de tensão ele só dispare em
regiões não-vitais. Por exemplo, nas pernas, no braço, na mão", cita o
advogado Gustavo Scandelari.
Uma reação desproporcional pode ser considerada crime.
"Quando há excesso, ele pode ser doloso, ou seja,
intencional [para matar]; no caso da pessoa que levanta e executa, ela responde
pelo homicídio, ou o excesso pode ser culposo, ou seja, sem intenção de
matar", aponta.
Direitos do suspeito
Mesmo tendo cometido algum crime - como tentativa de assalto,
por exemplo - o suspeito pode ir à Justiça contra quem agiu em legítima defesa.
"Ele [suspeito] pode se declarar vítima de lesão
corporal culposa, pleitear uma investigação e procurar um defensor público ou
constituir advogado. Ele pode sustentar a versão de que foi vítima de excesso
de legítima defesa e entrar até com processo cível por danos morais ou
materiais por conta do que considera uma reação desproporcional", cita
Scandelari.
Arma de terceiros
No caso de Ponta Grossa, a arma era registrada no nome do
empresário que reagiu ao assalto.
Porém, de acordo com o advogado criminalista, em casos de
legítima defesa não é necessário que a arma usada seja da própria pessoa.
"Prevalece o princípio da proteção, do bem jurídico mais
importante que é a vida ou a integridade. Qualquer pessoa, se ela se defender
de modo proporcional, pode usar uma arma de fogo desde que fique claro e
provado que a pessoa só usou porque era o meio disponível e com a intenção de
se defender. Então, uma pessoa qualquer que nunca pegou uma arma de fogo, se
ver alguém agredindo com um facão, com arma de fogo, e vê uma arma no chão,
pode fazer uso dessa arma para se repelir aquela agressão - contra terceiros,
inclusive", diz.
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No caso de alguém que está portando uma arma irregular ou sem
permissão, vai responder por esses crimes, mas não por lesão corporal ou por
homicídio, em casos de legítima defesa.
"Isso tudo só pode ser definido com uma investigação
cuidadosa. As pessoas no entorno têm que ser investigadas, as qualidades
técnicas e emocionais de cada um naquele momento do fato têm que tentar ser
apuradas. investigações cuidadosas devem ser feitas antes de se determinar com
segurança se aquela ação de defesa foi legítima ou não", conclui Gustavo
Scandelari.