O post já passou das 18 mil curtidas no LinkedIn e diversos
usuários relataram episódios semelhantes
Mulher é demitida após retorno da licença-maternidade — Foto: Reprodução/LinkedIn |
Diversos relatos foram feitos na rede social LinkedIn nas
últimas semanas mostrando casos de mulheres demitidas após voltar da licença-maternidade. Um
deles, que viralizou nesta semana, é de Flávia Rocha, que falou que, ao
retornar do período de afastamento, em 5 minutos foi “recebida com uma demissão”.
"Comecei a me organizar para a volta ao trabalho com 2
meses de antecedência. Sem rede de apoio, minha única saída seria deixar meu
bebê (tão esperado, planejado e sonhado) em um berçário. Noites em claro, choro
e dias de muito sofrimento para tomar essa decisão", afirmou.
Flávia continua: "Berçário escolhido, estoque de leite,
logística planejada com meu marido. Pronto! Tudo organizado para o meu retorno.
Fui com o coração na mão, mas fui. Após 10 anos, em 5 minutos fui recebida com
uma demissão".
A demissão de Flávia aconteceu no dia 13 de junho, quando seu
filho estava com cinco meses e 15 dias, o que a retirava do período
de estabilidade. A profissional explicou ao Valor que
atuava na empresa em regime CLT: inicialmente como Gerente de Qualidade e,
depois, há 4 anos, como Gerente de Gente e Gestão.
O post de Flávia já passou das 18 mil curtidas
na rede e diversos usuários relataram episódios semelhantes.
“O fato que mais me chama atenção é que somente hoje vi 4
postagens iguais. São 4 mães que após voltarem da licença foram desligadas”,
diz um usuário.
“Passei pelo mesmo sentimento que você, acho que meu
desligamento também levou 10 minutos onde estava trabalhando por 17 anos”, diz
o relato de outra profissional.
O que diz a Lei?
Juliana Coelho, advogada trabalhista na CMRD Advogados,
explica que a legislação garante estabilidade provisória da gestante desde a
concepção até cinco meses após o parto. Durante este período, a grávida ou a
lactante não poderá ser demitida sem justa causa, e, durante a estabilidade, só
poderá ser demitida caso haja uma hipótese de justa causa.
A estabilidade provisória consiste em uma proteção ao emprego
da gestante em relação à demissão sem justa causa com o intuito de assegurar
que a mulher não seja dispensada do emprego devido à descoberta da gravidez. O
direito vale para a empregada temporária, efetiva, terceirizada e doméstica.
“A dispensa sem justa causa faz parte do poder do empregador.
Assim, uma vez transcorrido o período da estabilidade legal e não havendo
disposição em convenção coletiva quanto a matéria, a empresa pode efetivar a
demissão”, diz a especialista.
Segundo Juliana, a estabilidade é concedida à mulher durante
cinco meses, o que dá o tempo de licença-maternidade (quatro
meses) mais um mês após o parto, ou seja, com a criança com cinco
meses de vida. No caso de Flávia, a empresa esperou passar o
período de estabilidade para desligar a profissional.
A licença-maternidade é o direito de afastamento das
atividades de trabalho concedido às mulheres em decorrência do nascimento ou da
adoção de um filho, tendo duração de, no mínimo, 120 dias a contar no
nascimento do bebê, podendo ser prorrogado em casos de parto prematuro, explica
Líbia Alvarenga, sócia da área trabalhista na Innocenti Advogados.
Caso a empresa faça parte do programa “Empresa Cidadã”, a
licença-maternidade poderá durar 180 dias. Porém, quando a empregada retornar
ao trabalho, não fará jus ao direito de estabilidade, descreve a especialista.
Caso as empresas descumpram o que diz a
legislação, podem sofrer processos na justiça, inquéritos no Ministério Público
do Trabalho e procedimentos administrativos com aplicação de multas pelo
Ministério do Trabalho e Emprego.
“A mãe trabalhadora que não tenha estabilidade respeitada pode
requerer judicialmente sua imediata reintegração, ou, caso a reintegração não
seja viável, indenização correspondente aos salários e demais direitos
correspondentes ao período de estabilidade”, pontua Juliana.
Em alguns casos é possível também pedir indenização
por danos morais, caso a demissão acarrete prejuízos emocionais e
psicológicos na trabalhadora, diz Líbia.
Desigualdade no mercado de trabalho
Não é novidade que as mulheres sofrem no mercado de trabalho
após se tornarem mães. No post, a própria autora cita uma pesquisa de 2023
do site Empregos.com.br que constatou que 57% das
entrevistadas disseram já terem sido demitidas ou conhecerem outra mulher que
foi demitida após a licença-maternidade.
Já um estudo da FGV de 2016 mostrou que a queda no
emprego começa imediatamente após o período de proteção ao
emprego garantido pela licença (quatro meses) e que, após 24 meses, quase
metade das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do
mercado de trabalho.
“O que predomina são duas questões: a cultura de
que, se a mulher teve um filho, ela vai ser menos produtiva, por exemplo,
porque vai ter que dar atenção ao filho e, em segundo, que eu acredito que
melhoraria também essa situação, é que a licença paternidade não é equânime com
a licença maternidade e isso gera um desequilíbrio no ambiente de trabalho
porque as empresas preferem contratar homens, já que vão ter uma licença menor
do que as mulheres”, ressalta Juliana.