Exame indica que substância desaconselhada para estética foi
aplicada na paciente que denunciou caso à polícia.
Raquel Roseli Demichei Dornelles ficou com o rosto deformado após procedimento estético — Foto: Arquivo pessoal
A defesa da Clínica Revive, do farmacêutico Tiago Tomaz da
Rosa e da esposa dele, a médica Carolina Milanezi Bortolon Rosa, investigados
por suspeita de deformar o rosto da cliente Raquel Roseli Demichei Dornelles,
negou as acusações feitas pela mulher. Em nota, a defesa afirmou que ela assinou
documento consentindo o procedimento "estando ciente das possíveis reações
adversas".
A investigação da Polícia Civil pelos possíveis crimes de
exercício ilegal da profissão e lesão corporal de natureza grave começou após a
paciente denunciar o procedimento estético realizado em Cascavel, no oeste do
Paraná. O caso também é acompanhado pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR).
Dornelles conta que procurou a Clínica Revive em junho de
2023 para fazer o procedimento chamado "Sculptra", para estimular
produção de colágeno na pele. No entanto, ela alega que o farmacêutico aplicou
no rosto dela polimetilmetacrilato (PMMA).
A substância foi indicada por um exame de biópsia contratado
pela vítima. A nota encaminhada pela defesa da clínica não cita o produto usado
no procedimento estético.
Segundo o Conselho Regional de Farmácia (CRF-PR), o PMMA é
uma substância sintética aprovada para uso médico em casos específicos, como
cirurgias reparadoras, e desaconselhada para fins estéticos, pelo alto risco de
complicações, como inflamações, infecções e deformidades permanentes.
"A técnica profissional utilizada foi adequada, sem
qualquer imprudência, negligência ou imperícia por parte do profissional. O
profissional tem formação adequada, habilitação técnica para tanto e vasta
experiência", disse em nota a defesa da clínica.
A defesa afirmou ainda que "a paciente não apresenta,
presentemente, qualquer deformidade ou lesão por conta do procedimento estético
realizado" versão que contradiz o que alega a paciente, que diz ter ficado
com o rosto duro, cheio de nódulos e muito diferente do que era antes do
procedimento.
Raquel ficou com o rosto permanentemente deformado após procedimento — Foto: Arquivo pessoal
"No início tinha muita dor. Eu comecei a ter várias alergias.
Eu não podia mais me olhar no espelho. Eu eu passei por um médico psiquiatra,
para tomar remédio. Nem meu marido me aguentava, porque eu me olhava no
espelho, eu me achava feia. Eu quase me separei", contou Raquel ao g1.
Por fim, a defesa da clínica diz que a paciente foi acionada
judicialmente pelas afirmações "caluniosas, difamatórias e
injuriosas" e que buscará reparação dos danos morais sofridos pelos
profissionais.
Fiscalização constatou irregularidades na clínica, diz
conselho
Em setembro, motivados pelo relato feito ao Ministério
Público, o Conselho Regional de Farmácia e o Conselho Regional de Medicina do
Paraná (CRM-PR) realizaram uma inspeção na Clínica Revive.
Segundo o CRF, durante a inspeção, a equipe constatou
diversas irregularidades, incluindo a utilização do PMMA.
O órgão afirmou ainda que a Clínica Revive já foi alvo de
outras denúncias envolvendo práticas inadequadas e possíveis violações de
normas sanitárias.
O g1 questionou o CRF sobre quais denúncias
foram essas, quando elas foram feitas e se elas foram acompanhadas pelo
conselho. No entanto, o órgão não respondeu às perguntas.
O CRF disse também que está conduzindo uma análise detalhada
da denúncia, para garantir uma apuração completa e transparente, e que as
medidas necessárias sejam tomadas.
Dores, alergias e medicamentos
Raquel conta que demorou cerca de 9 meses para entender que
haviam feito um procedimento diferente do qual ela tinha contratado.
Segundo ela, durante o procedimento relatou ao farmacêutico
que estava sentido muita dor. No entanto, ele disse a ela que era um sintoma
comum do "Sculptra".
Em casa, a dor não passou, e Raquel começou a notar que rosto
estava inchando, momento que decidiu procurar a clínica novamente.
Ela afirma que, na clínica, foi medicada, e que Tiago disse
novamente a ela que o inchaço era comum e fazia parte do procedimento.
Raquel alega ainda que, no local, era medicada pela esposa do
farmacêutico, a dermatologista Carolina Milanezi Bortolon Rosa, que dizia a ela
que os efeitos colaterais eram resultados de uma alergia.
Segundo ela, até aquele momento, ainda acreditava que se
tratava de efeito colateral do procedimento que havia contratado e tinha a
esperança que o corpo absorvesse a substância aplicada, como o esperado nas
utilizações de "Sculptra".
"Eu continuei indo porque ele falou: 'Raquel, você teve
um processo diferente. Vai gerar mais colágeno'. Eu continuei inchando e eu
pensei: 'Daqui a um ano, meu corpo vai absorver e vai voltar ao formato
normal'", lembra a vítima.
Após não ver melhoras, a empresária decidiu procurar
atendimento dermatológico especializado. O médico que a atendeu suspeitou do
produto usado e pediu para ela realizar um exame de biópsia, que indicou a presença
de PMMA no rosto da paciente.