Pessoas já foram mortas no estado por posar ao fazer sinais de ‘2’ ou ‘3’
Sinais de '2' ou '3' foram apropriados por facções criminosas Crédito: Thianá Dayube / ARTE CORREIO |
Quem mora na Bahia, já sabe: se vai posar para foto, melhor
não fazer sinais com as mãos. Por aqui, sinais de '2' ou '3' que antes eram
usados em contextos descontraídos, foram apropriados por facções criminosas. O
2, para o tráfico, significa ‘tudo 2’, o que é uma saudação ao Comando Vermelho
(CV). O 3, por sua vez, é ‘tudo 3’, o que seria uma alusão ao Bonde do Maluco (BDM),
grupo rival.
Qualquer um dos dois é visto como uma afronta para
traficantes do grupo contrário. Então, na hora de registrar a passagem por
cartões postais no estado, o recomendado é não os usar. Um policial militar,
com mais de 10 anos de atuação e que prefere não se identificar, explica por
que ‘Tudo 2’ ou Tudo 3’ ganharam uma roupagem tão violenta.
“Se você vai em um bairro de Salvador ou na Região
Metropolitana (RMS) onde há domínio de facção, é comum ver em postes ou paredes
pichações de T2 ou T3, o que quer dizer que aquela facção está no local. Os
sinais são vistos assim também. Então, se você vai na área do CV e faz o T3,
eles entendem que está afirmando a presença do grupo rival ali e vice-versa.
Por isso, as respostas brutais”, relata.
Além dos gestos, os perigos dos números se impõem até em
visuais ou cortes de cabelo. Neste caso, a restrição está ligada ao número de
listras que alguém pode fazer no cabelo ou na sobrancelha. Caso sejam três,
podem ser interpretadas como um marco identificador de um integrante do BDM. Se
forem duas, é possível que a pessoa seja confundida com alguém que tem
associação ao CV.
Um dos exemplos mais marcantes de resposta brutal aos sinais
foi a execução dos irmãos Daniel Natividade, 24 anos, e Gustavo Natividade, 15,
vítimas de traficantes do CV. Os dois, que eram músicos do bloco afro Malê
Debalê e não tinham qualquer envolvimento com o crime, foram mortos horas
depois de posarem para uma foto durante um passeio em Emissário de Arembepe,
área turística de Camaçari.
Nas mãos, as vítimas e outras duas pessoas faziam o ‘sinal do 3’, o que, para seus assassinos, saudava o BDM. Apesar de baianos, os irmãos eram de Salvador e estavam em Emissário como turistas, desconhecendo a realidade da região.
Sinais feitos pelas vítimas foram apropriados pelas facções Crédito: Reprodução |
Na época do crime, um policial penal, que também preferiu não
se identificar, afirmou que a dinâmica dentro dos presídios do estado evidencia
o peso dos símbolos já na chegada dos presos nas penitenciárias que,
atualmente, alocam membros de facções rivais em pavilhões diferentes.
“Quando eles adentram o pavilhão, os outros detentos começam
com algumas perguntas, alguns linguajares e gestos para eles se identificarem,
para verificar se eles realmente são de determinada facção”, explica o
policial, que ainda alerta para o uso de tatuagens que, de um tempo para cá,
foram apropriadas pelas facções criminosas.
Além dos irmãos Natividade, ao menos quatro pessoas morreram
por conta dos sinais na Bahia em 2024. Após a repercussão, um suposto
comunicado do CV circulou nas redes proibindo as mortes por conta dos sinais no
início de janeiro. No entanto, no último dia 21 de janeiro, um jovem,
identificado apenas como Felipe, foi raptado e executado por membros da facção
após fazer o sinal de 3 no Cemitério Quinta dos Lázaros, onde acompanhava um
enterro. Ele já era observado pelo CV, quando foi raptado e levado para o
bairro de Cidade Nova, local onde foi morto.